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Publicado em
24/11/21

Você domina o manejo primário do trauma cranioencefálico?

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Você domina o manejo primário do trauma cranioencefálico?

O traumatismo cranioencefálico (TCE) é uma importante causa de morte em todo o mundo. Tendo como suas principais causas as quedas (35,2%), as colisões automobilísticas (17,3%) e a violência (10%).

Além disso, são mais suscetíveis ao TCE as crianças menores de 4 anos, adolescentes com idade entre 15 e 19 anos, e idosos com idade superior a 65 anos.

Para mais, devido a 50% dos óbitos ocorrerem nas primeiras 2 horas após o trauma, por isso é fundamental conhecer os princípios iniciais do tratamento. São eles a manutenção dos níveis pressóricos, oxigenação da vítima, identificação dos pacientes com risco de herniação e com pressão intracraniana elevada.

Quais os tipos de lesão do traumatismo cranioencefálico?

Fraturas de crânio

As fraturas de crânio podem resultar de traumas fechados ou penetrantes. Podendo provocar fraturas lineares e afundamento do crânio. E mais, quando ocorrem na base do crânio, podem apresentar-se com sinais clínicos característicos e fundamentais de serem reconhecidos.

Fraturas lineares

Correspondem a mais de 80% das fraturas causadas pelo traumatismo cranioencefálico , e podem estar associadas com lesões intracranianas e hemorragias epidurais. O diagnóstico é feito por estudo radiológico.

Tomografia computadorizada (TC) sem contraste evidenciando uma fratura de base do crânio linear, próxima ao forame magno. Fonte: https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/398
Tomografia computadorizada (TC) sem contraste evidenciando uma fratura de base do crânio linear, próxima ao forame magno. Fonte: BMJ Best Practice

Fraturas com afundamento 

Diferentemente das fraturas lineares, podem ser diagnosticadas através da palpação no exame físico. Quando associadas à laceração do couro cabeludo, representam uma urgência neurológica, devido ao risco aumentado de grandes perdas sanguíneas e lesões na dura-máter e do encéfalo.

TC sem contraste de fratura craniana depressiva no osso frontal. Fonte: https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/398
TC sem contraste de fratura craniana depressiva no osso frontal. Fonte: BMJ Best Practice

Fraturas de base do crânio

Estão fortemente associadas com lesões do sistema nervoso central (SNC), fístulas arteriovenosas e fístulas liquóricas. E ainda, à hipertensão intracraniana.

Sinal do guaxinim (equimose periorbital). Fonte: https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJHR/article/viewFile/25560/20350
Sinal do guaxinim (equimose periorbital). Fonte: Brazilian Journal of Health

Alguns sinais clínicos como otorreia, edema, equimose/hematoma periorbitário (sinal do guaxinim) podem estar presentes. E ainda, a equimose da região retroauricular (sinal de Battle).

Sinal de Battle (equimose retroauricular). Fonte: MSD Saúde
Sinal de Battle (equimose retroauricular). Fonte: MSD Saúde

Além das lesões na caixa óssea, o trauma pode provocar lesões no parênquima. São elas a concussão cerebral, a contusão cerebral e a lesão axonal difusa. 

Assim, para compreender as principais diferenças entre as hemorragias causadas pelo traumatismos cranioencefálico (subdural e extradural), você pode acessar este texto

Concussão cerebral

É uma lesão cerebral de grau leve, temporária e reversível. Sendo o diagnóstico clínico, porque a lesão causada pelo traumatismo cranioencefálico não poderá ser evidenciada no exame de imagem.

Assim, o diagnóstico é feito quando há perda transitória da consciência - segundos ou minutos - seguida de desorientação e confusão mental.

Para mais, outros sinais e sintomas que podem estar presentes são a cefaleia, a incapacidade de concentração e a confusão mental. E ainda, vertigem, amnésia pós-traumática e irritabilidade.

Contusão cerebral

A contusão cerebral é uma consequência do trauma contuso, mas também pode ocorrer em trauma penetrante. É um dano no parênquima cerebral pelo impacto do córtex cerebral na caixa óssea. Portanto, é mais grave do que a concussão.

Esse tipo de lesão está associado a hemorragias e lacerações corticais. Representando alto risco de herniações cerebrais e hipertensão intracraniana, devido ao edema pericontusional. Além disso, está presente em 20 a 30% das lesões cerebrais graves.

Para mais, assim como na concussão, o diagnóstico é clínico. Isso porque as alterações nos exames de imagens somente poderão ser evidenciadas 24 horas após o trauma. Assim, deve-se estar atento para rebaixamento prolongado do nível de consciência, vômitos e convulsões.

TC de crânio sem contraste evidenciando contusão cerebral na região frontal. Fonte:  https://radiopaedia.org/articles/cerebral-haemorrhagic-contusion
TC de crânio sem contraste evidenciando contusão cerebral na região frontal. Fonte: Radiopaedia

O exame de imagem evidencia principalmente lesões múltiplas, bilaterais e simétricas. E mais, normalmente nas regiões frontotemporal e occipital.

Lesão axonal difusa

As lesões axonais são decorrentes da tração dos axônios pela desaceleração brusca que ocorre no contexto do traumatismo cranioencefálico. São lesões difusas que podem acometer a substância branca, as regiões subcorticais, o corpo caloso e o tronco encefálico.

Elas provocam um quadro neurológico grave. Podendo haver instalação aguda e coma, devido a interrupção das funções cerebrais pelo sistema reticular ativador ascendente (SRAA). Assim, cerca de 44% dos comas após TCE são decorrentes das lesões axonais difusas.

Representação da lesão axonal difusa. Fonte: Dr. Rafael Oliveira
Representação da lesão axonal difusa. Fonte: Dr. Rafael Oliveira

Herniações cerebrais

São indicativos de herniação cerebral as pupilas não reativas ou assimétricas, bem como a postura em extensão (decorticação) ou ausência da resposta motora ao estímulo. E mais, a deterioração progressiva do Glasgow (diminuição maior ou igual à dois pontos no paciente com escala inicial < 9).

Tipos de herniações cerebrais. Fonte: ISAEM (https://isaem.net/herniacao-cerebral-ich-e-ich/)

Leia mais:

Qual a conduta inicial do TCE?

No exame físico primário, seguimos o mnemônico ABCDE.

A (Airways)

Nesse momento, é fundamental garantir a via aérea e estabilizar a coluna, com a colocação do colar cervical, do paciente que tenha sofrido um traumatismo cranioencefáico. Idealmente, deve-se garantir a via aérea definitiva para minimizar os riscos de hipóxia cerebral.

Para mais, a via aérea definitiva deve ser estabelecida em todo paciente com TCE grave (Glasgow ≤ 8), hipoxemia não corrigida com O2 suplementar e quando inábeis de manter a via aérea pérvia.

B (Breathing)

É de fundamental importância avaliar a frequência respiratória, a profundidade e eficiência da respiração. E ainda, objetiva-se manter a saturação de oxigênio (SpO2) > 92%, com o monitoramento pela oximetria de pulso. E mais, todos os pacientes devem receber oxigênio suplementar com 100%.

Nesse momento, deve-se ter o cuidado de não hiperventilar o paciente. Isso porque a hiperventilação provoca a vasoconstrição, diminuindo a oferta de O2 para o cérebro.

Entretanto, pode-se considerar a hiperventilação em caso de suspeita de herniação cerebral. Assim, quando houver controle da hipovolemia e da hipóxia, considera-se a hiperventilação nesse caso. Devendo ser feita por curto período, até que os sinais de herniação desapareçam.

C (Circulation) 

Procura-se controlar hemorragias e prevenir o choque, objetivando manter a PA > 90 mmHg durante todo o atendimento de suporte.

Em caso de choque, opta-se pelas soluções cristalóides isotônicas, em ambiente pré-hospitalar. Já no ambiente intra-hospitalar, a reposição volêmica deve ser feita com soluções isotônicas e sangue.

D (Déficit)

Na avaliação primária, utiliza-se a escala de coma de Glasgow e a avaliação das pupilas para investigação do estado neurológico do paciente. Observe a tabela abaixo.

Escala de Coma de Glasgow
Parâmetro Resposta Obtida Pontuação
Abertura Ocular Espontânea 4
Ao estímulo sonoro 3
Ao estímulo de pressão 2
Nenhuma 1
Resposta verbal Orientada 5
Confusa 4
Verbaliza paralvras soltas 3
Verbaliza sons 2
Nenhuma 1
Resposta motora Obedece comandos 6
Localiza estímulo 5
Flexão normal 4
Flexão anormal 3
Extensão anormal 2
Nenhuma 1
Trauma leve Trauma moderado Trauma grave
13-15 9-12 3-8
Reatividade pupilar
Inexistente Unilateral Bilateral
-2 -1 0

Escala de coma de Glasgow. Fonte:  UFJF (https://www2.ufjf.br/neurologia/2018/12/11/escala-de-coma-de-glasgow-importancia-e-atualizacao-de-2018/)

A diferença maior que 1 mm entre as pupilas é considerada anormal. Ou seja, toda anisocoria (diferença no diâmetro pupilar) neste contexto deve ser interpretada como secundária ao traumatismo cranioencefálico.

Para mais, caso o paciente apresente convulsões, utiliza-se benzodiazepínico por via intravenosa. Esse medicamento não deve ser utilizado como profilático para convulsões.

E ainda, é fundamental observar os sinais de alerta: perda de dois pontos ou mais em espaço curto de tempo da escala de coma de Glasgow e a anisocoria (comentadas previamente). 

E mais, as pupilas não reativas à luz, desenvolvimento de hemiparesia ou hemiplegia e o fenômeno de Cushing (hipertensão arterial, bradicardia, anomalias no padrão respiratório).

E (Exposure)

Por fim, o mnemônico preconiza a avaliação da exposição do paciente no contexto do trauma. Nesse momento, procura-se ativamente por outras lesões que possivelmente não foram encontradas à primeira vista, e mantém-se o controle da temperatura.

Fonte:

  • SUEOKA, J., ABGUSSEN, C. APH - Resgate - Emergência em Trauma. Rio de Janeiro: Elsevier Editora LTDA, 2019.