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Publicado em
3/1/23

Rins Policísticos: veja quais são os sintomas, causas e tratamento

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Rins Policísticos: veja quais são os sintomas, causas e tratamento

As Doenças Renais Císticas são um campo muito amplo de estudo devido a sua variabilidade de causas genéticas, curso clínico, manifestações sintomatológicas e prognóstico. Vista essa  heterogeneidade, vamos afunilar nosso estudo em uma das duas doenças císticas renais hereditárias: a Doença Renal Policística Autossômica Dominante (DRPAD).

A outra condição desse grupo de fundo genético seria a Renal Policística Autossômica Recessiva (DRPAR), porém, para facilitar a organização do seu estudo, abordaremos essa patologia em outro momento.

Sendo assim, vamos agora compreender a definição, apresentação clínica, diagnóstico e tratamento dessa condição renal que possui uma grande relevância epidemiológica na especialidade da Nefrologia!

O que são Rins Policísticos?

Focando em Doença Renal Policística Autossômica Dominante (DRPAD), ela se caracteriza pelo surgimento e crescimento progressivo de cistos renais múltiplos em ambos os rins, acarretando em alargamento e distorção desses órgãos, que eventualmente evoluem para a Doença Renal Crônica (DRC). Com o avanço dessa patologia, a DRC pode alcançar a Doença Renal Crônica Terminal, que se traduz na falência dos rins.

A DRPAD não se limita ao sistema excretor, ela também é uma doença sistêmica caracterizada por hipertensão arterial e cistos extra-renais, que podem ocorrer no fígado, pâncreas, baço, vesículas seminais, membrana aracnóide e ovários.

O surgimento dessa condição geralmente acontece no início da vida - apesar da sua detecção ser tardia, por se desenvolver de maneira silenciosa. Caso seja identificada próxima ao seu surgimento, deve ser dividida em Início Muito Precoce, quando é diagnosticado não-acidentalmente em idade < 2 anos, e Início Precoce, quando é diagnosticado não acidentalmente entre 1 ano e meio e 15 anos de idade. De maneira geral, a DRPAD também se encaixa como a forma hereditária mais comum de causar falência renal e uma das mais comuns de evoluir para Doença Renal Crônica Terminal.

Representação de um Rim Policístico. Fonte: Shutterstock
Representação de um Rim Policístico. Fonte: Shutterstock

Como diagnosticar os Rins Policísticos 

O diagnóstico da Doença Renal Policística Autossômica Dominante começa na suspeição clínica, pela anamnese e exame físico. O paciente chegará ao consultório com as queixas mais frequentes: dor aguda ou crônica que pode ocorrer na lombar, flancos e/ou abdômen, febre, hematúria, sintomas de ITU (infecção do trato urinário), nefrolitíase e hérnias. Perguntar sobre o histórico familiar de doenças renais, especialmente DRPAD e Doença Renal Crônica Terminal, é imprescindível.

É importante também pedir para o paciente caracterizar a dor lombar/abdominal que sente. Será compatível com a DRPAD as características de dor difusa, em cólica, lenta e latejante. Apesar disso, o caráter agudo também pode ser observado

Geralmente a dor de caráter crônico está mais associada ao mecanismo compressivo da expansão cística e/ou hepática, enquanto a aguda está mais associado a infecções e rupturas de cistos, além de nefrolitíase (DRPAD é um fator de risco para sua ocorrência).

Além dos sintomas colhidos, outros achados clínicos são: hipertensão arterial sistêmica (HAS), anemia, hiperparatireoidismo secundário, desnutrição e doença metabólica óssea. Uma vez que a DRPAD progride e se estende formando cistos no fígado, sintomas no trato gastrointestinal poderão ser vistos, como plenitude gástrica, distensão abdominal, doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), náuseas e vômitos, obstrução biliar e obstrução das veias portais hepáticas.

Exame físico

No exame físico deve-se primeiramente aferir a pressão arterial para identificar HAS indicativa de DRPAD e também aferir a temperatura para identificar febre indicativa de Infecção Cística e Hemorragia no Trato Urinário. A palpação abdominal deve ser realizada pelo Método de Guyon ou pelo Método de Israel, além da percussão lombar pela manobra de Giordano para identificar sensibilidade no ângulo costovertebral indicativo de afecção da cápsula renal.

Manobra de Giordano. Fonte: Made For Medical
Manobra de Giordano. Fonte: Made For Medical

O exame complementar de escolha para fechar a hipótese diagnóstica de DRPAD é a Ultrassonografia Renal. Os critérios baseados na USG foram unificados pela instituição Kidney Disease Improving Global Outcomes (KDIGO) e valem para aqueles pacientes com histórico familiar de DRPAD. Confira abaixo:

  • ≥ 3 cistos unilaterais ou bilaterais na faixa etária de 15-29 anos
  • ≥ 3 cistos unilaterais ou bilaterais na faixa etária de 30-39 anos
  • ≥ 2 cistos unilaterais ou bilaterais na faixa etária de 40-59 anos

Ultrassonografia de Cistos Renais. Fonte: Colégio Brasileiro de Radiologia‍
Ultrassonografia de Cistos Renais. Fonte: Colégio Brasileiro de Radiologia

Em pacientes sem histórico familiar da doença, inclui-se os seguintes critérios: cistos e alargamento renal bilateral e cistos hepáticos. Já nos pacientes mais jovens, a Ressonância Magnética pode mostrar as formações císticas com mais clareza.

Exames laboratoriais

Além dos exames diagnósticos, é de suma importância avaliar o grau de comprometimento da função renal em busca do estágio de Doença Renal Crônica. Para isso, solicita-se dosagem laboratorial de Creatinina sérica e estimativa de Taxa de Filtração Glomerular (TFG). Ademais, a checagem de infecção em um dos cistos é feita por medição de Proteína C-reativa (> 5mg/dL acompanhado de febre e dor local é indicativo de infecção), hemocultura e VHS elevado.

Por fim, é realizada urinálise que tende a apresentar hematúria microscópica ou macroscópica, proteinúria e, em casos de infecção, urocultura positiva. Os microorganismos envolvidos são geralmente a E. coli, S. aureus, Enterococcus, Lactobacillus e bactérias anaeróbias.

Quais as causas dos Rins Policísticos?

A Doença Renal Policística Autossômica Dominante é uma condição heterogenética causada por mutações no gene PKD1 e PKD2. A mutação no gene PKD1 ocorre em 78% dos pacientes e está mais relacionado a casos graves de DRPAD, tendo a média de idade de aparecimento da Doença Renal Crônica Terminal de 58 anos. 

Já a mutação do PKD2 acontece em 15% dos casos e tem incidência média de Doença Renal Crónica Terminal aos 79 anos. O tipo de mutação ocorrida no cromossomo é muito variado e atualmente conhece-se mais de 1.500 possibilidades.

Como funciona o tratamento dos Rins Policísticos?

O tratamento da Doença Renal Policística Autossômica Dominante deve ser iniciado cedo, no momento que o parênquima renal está relativamente preservado. O enfoque do manejo é limitar o crescimento dos cistos e preservar ao máximo a função renal. O tratamento em si é composto de medidas farmacológicas, não-farmacológicas e cirúrgicas.

Tratamento não-farmacológico

A abordagem não-farmacológica inclui mudanças de estilo de vida mais gerais, como exercício físico, dieta balanceada e diminuição do consumo de sódio. Além de terapia de hidratação com aumento do consumo de água na intenção de prevenir nefrolitíase, desacelerar a insuficiência renal e aliviar os sintomas associados a sangramento dos cistos. 

Ademais, aconselhamento genético é fortemente recomendado para pacientes em idade reprodutiva que desejam iniciar ou aumentar sua prole.

Tratamento farmacológico

As principais medidas farmacológicas são voltadas principalmente para as complicações da DRPAD. 

  • Anti Hipertensivos: além de controlar o aumento da pressão arterial secundário ao desbalanço do eixo Renina-Angiotensina-Aldosterona, também estão relacionados à desaceleração do crescimento dos cistos renais.
  • Estatinas: diminuem o crescimento do volume renal em adultos com DRPAD e TFG diminuída.
  • Desmopressina: indicada para o manejo dos sangramentos císticos em adultos com função renal já rebaixada (TFG < 15/mL/min/1.73m2).
  • Antibióticos: usado nos pacientes com infecção dos cistos renais.
  • Analgésicos: usados para a dor abdominal e/ou lombar frequente da condição.
  • Tolvaptan: é um antagonista seletivo do receptor V2 da vasopressina. Ele controla o declínio da função renal de adultos que possuem risco de progressão rápida da DRPAD.

Tratamento cirúrgico

A escolha por terapias cirúrgicas geralmente ocorre na intenção de alívio sintomatológico em pacientes com prejuízo significativo das atividades cotidianas secundário à dor. Os mecanismos de realização são diversos, mas os principais são a aspiração ou fenestração do(s) cisto(s) e a denervação renal. Além disso, há o manejo da complicação de nefrolitíase por nefrolitotomia percutânea.

Conclusão

A Doença Cística Renal é um conceito com diversas patologias subjacentes. No texto de hoje, identificamos a definição da Doença Renal Policística Autossômica Dominante, além da sua ligação causal com a mutação dos genes PKD1 e PKD2. Seu quadro clínico é formado por, principalmente, dor abdominal e/ou lombar e sintomas urinários e suas complicações mais comuns são: infecção, nefrolitíase e hemorragia dos cistos. 

O diagnóstico deve ser feito por coleta de dados sintomatológicos e familiares, além da utilização importantíssima da Ultrassonografia associada aos critérios de KDIGO. O tratamento deve ser composto por diversas abordagens, sendo elas farmacológicas, não-farmacológicas e cirúrgicas.

Leia mais:

FONTES:

  • Martins, Mílton de, A. et al. Clínica Médica, Volume 3: Doenças Hematológicas, Oncologia, Doenças Renais. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Editora Manole, 2016.