A esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico grave, com pacientes com apresentações variáveis. Sinais e sintomas incluem alterações de percepção na emoção, cognição, no pensamento e no comportamento. É uma doença descrita há anos, com nomes diferentes, já sendo chamada no passado de “demência precoce”. Está presente em cerca de 1% da população.
Ainda é uma condição extremamente estigmatizada, mesmo com tratamentos capazes de manter bom controle da doença e de permitir bom convívio em sociedade dos afetados pela doença.
Nesse post iremos abordar sua epidemiologia, subtipos, como diagnosticar e como tratar a esquizofrenia.
Epidemiologia
A esquizofrenia é uma doença com distribuição relativamente igual entre os sexos, porém costuma se iniciar mais precocemente em homens, com média entre os 20 anos. As mulheres costumam ter início entre os 30 anos.
É uma doença crônica, que persiste durante toda a vida e afeta pessoas de todas as classes sociais. Nos EUA, é ainda mais prevalente entre os moradores de rua, chegando a 15 a 45% desta população. Isso provavelmente se deve aos fatores estressores desencadeantes e a estigmatização.
É muito comum que esse grupo populacional apresente abuso de substâncias, principalmente tabagismo, podendo chegar até 90%.
Etiologia
Estudos mostram que a dopamina seria a responsável pelos sintomas psicóticos, seu excesso de liberação, aumento de receptores e/ou hipersensibilidade deles. As vias dopaminérgicas mais envolvidas são as vias dopaminérgicas mesolímbica, mesocortical e nigro-estriatal.
Além dela, outros neurotransmissores como a serotonina, norepinefrina e GABA também parecem ter relação. Em relação às alterações cerebrais, foram vistos perda de volume do encéfalo em pacientes com esquizofrenia, com alargamento do ventrículo. Isso provavelmente se deve a diminuição dos axônios, dendritos e sinapses.
Fatores de risco
A esquizofrenia é uma doença com grande fator genético, pois a presença de parentes biológicos em primeiro grau com a doença aumenta em 10 vezes o risco de desenvolver a doença. Além disso, pessoas vivendo em áreas urbanas, populações de imigrantes e minorias étnicas também têm maior probabilidade de desenvolvimento.
Vale ressaltar, ainda, eventos adversos pré-natais (hipóxia fetal, infecção materna, etc), complicações obstétricas, vulnerabilidade social, história de abuso, uso de maconha na adolescência e negligência na infância como fatores de risco.
Quadro clínico
Sinais e sintomas incluem alterações de percepção, na emoção, na cognição, no pensamento e no comportamento. Não existe nenhum sintoma patognomônico. Para mais, os sintomas podem mudar com o tempo.
Homens têm sintomas mais negativos, como embotamento afetivo e social, que mulheres. Já as mulheres costumam ter mais sintomas positivos, que são alucinações e delírios.
O exame do estado geral pode variar de pessoa completamente desleixada e agitada até alguém obsessivamente arrumado, silencioso e imóvel. Também são observadas posturas bizarras como não tomar banho ou usar roupas inadequadas, presença de tiques e imitação da postura do examinador.
O afeto encontra-se anormal e a responsividade emocional reduzida, podendo ter emoções exageradamente ativas e impróprias. A presença de distúrbios perceptuais é comum, como alucinações, as mais comuns são as auditivas, sendo seguido pelas alucinações visuais.
Ademais, o pensamento encontra-se com conteúdo inadequado, como delírios persecutórios, pensamento religioso ou sobrenatural. Mostram-se com frouxidão de associações, usam muitos neologismos, discurso confuso ou mutismo.
Costumam ser orientados e com boa memória, porém com comprometimento cognitivo. O insight sobre a natureza do transtorno costuma ser baixo. Diferente do que se imagina, os pacientes esquizofrênicos não têm maior probabilidade de cometer homicídio do que a população geral, porém, as taxas de suicídio são altas, chegando a 20 a 50%.
Sinais e sintomas pré-mórbidos
Alguns pacientes podem mostrar alguns sinais e sintomas pré-mórbidos, ou seja, antes do desenvolvimento da doença. Um forte indicativo é a presença de transtorno de personalidade esquizóide e esquizotípica, que se caracterizam por personalidade quieta, passiva, excêntrica e introvertida.
Na infância, não tinham muitos amigos e evitaram atividades sociais. Com o início dos sintomas, o indivíduo começa a desenvolver interesse por ideias abstratas, filosofia e questões ocultas ou religiosas.
Pode aparecer comportamento acentuadamente excêntrico, afeto anormal, discurso incomum, ideias bizarras e experiências perceptuais estranhas.
Principais subtipos
Para melhor compreensão da doença, foram criados subtipos de pacientes com esquizofrenia que apresentam características semelhantes. Alguns dos principais subtipos incluem: paranóide, desorganizado, catatônico, indiferenciado e residual.
Paranoide
Esse subtipo é marcado pelos delírios de perseguição e de grandeza. O paciente mostra um ou mais delírios ou alucinações auditivas frequentes. Tendem a ser tensos, desconfiados, cautelosos e reservados, podendo ser às vezes hostis e agressivos.
Apresentam menor regressão das faculdades mentais, e menores respostas emocionais e de comportamento se comparado a outros subtipos.
Desorganizado
O subtipo desorganizado apresenta uma regressão acentuada para um comportamento primitivo, desinibido e desordenado. O início costuma ser precoce, antes dos 25 anos. Tendem a ser ativos, mas de uma forma não construtiva, sem objetivo.
O transtorno de pensamento é pronunciado e o contato com a realidade é pobre. A aparência pessoal é desleixada, e o comportamento social e as respostas emocionais são inadequadas. Sorrisos e caretas incongruentes são comuns.
Catatônico
O subtipo catatônico era comum décadas atrás, porém, hoje em dia é mais raro. Esse grupo apresenta um distúrbio acentuado da função motora, que pode envolver estupor, rigidez, excitação ou posturas bizarras, podendo apresentar alternâncias rápidas.
O mutismo é comum, assim como a presença de estereotipias, maneirismo e flexibilidade cérea. Durante a excitação, esses pacientes precisam de supervisão constante para impedir que se machuquem ou a outros.
Indiferenciado
Esse subtipo seriam aqueles pacientes com claro diagnóstico de esquizofrenia, porém que não se enquadram em nenhum subtipo com facilidade.
Residual
Esse subtipo inclui aqueles com evidências contínuas do transtorno, porém com ausência de conjunto completo de sintomas ativos ou suficientes. É comum embotamento emocional, retraimento social, comportamento excêntrico, pensamento ilógico e frouxidão leve das associações.
Diagnóstico
O diagnóstico é clínico. Os critérios propostos pelo DSM-V são:
No primeiro episódio psicótico, quando não se tem nenhum histórico psiquiátrico, é fundamental afastar outras doenças. Para isso, pode ser solicitado neuroimagem craniana, exames laboratoriais, sorologias, exame toxicológico etc.
Diagnóstico diferencial
Os principais diagnósticos diferenciais são: transtornos psicóticos induzidos por drogas, doenças infecciosas como neurossífilis e meningoencefalites, encefalopatias metabólicas, doenças autoimunes, tumores cerebrais, AVC, entre outros.
Nessa lista ainda se incluem outros transtornos psiquiátricos como episódio depressivo grave com sintomas psicóticos, transtorno afetivo bipolar, transtorno esquizoafetivo, transtorno delirante persistente etc.
Tratamento
O tratamento é feito com a combinação de antipsicóticos e tratamento psicossocial. A hospitalização é indicada apenas em fins de diagnóstico, estabilização da medicação e segurança do paciente.
É de grande importância o estabelecimento de associação efetiva entre o paciente e os sistemas de apoio da comunidade e família.
Tratamento medicamentoso
O uso do antipsicótico faz 70% dos pacientes alcançarem remissão e reduzirem sintomas. Como opção existem os antipsicóticos de 1ª geração (típicos), como a clorpromazina e o haloperidol, e os de 2ª geração (atípicos), como a risperidona, olanzapina e quetiapina.
São medicações que causam efeitos colaterais, como síndrome extrapiramidal, distúrbios do movimento, síndrome neuroléptica maligna, ganho de peso, hiperprolactinemia, prolongamento do intervalo QT e, por isso, devem ser usados com uma periódica verificação das condições do paciente.
O tratamento é dividido em 2 fases: a fase aguda e a fase de manutenção. A fase aguda visa à remissão. Inicia-se com um antipsicótico, de preferência atípico, em dose inicial, com elevação das doses a cada 4 a 6 semanas mesmo com melhora clínica. Se ao fim dessas semanas, paciente mostrou falha, recomenda-se trocar o antipsicótico.
Alcançada a remissão, inicia-se a fase de manutenção. Deve-se manter o antipsicótico na dose que obteve remissão de uso diário por pelo menos 1 ano. Após esse ano, é possível realizar redução de doses discretas e espaçadas buscando encontrar menor dose eficaz, se o paciente não mostrar recaídas.
Tratamento não farmacológico
Intervenções como terapia cognitivo-comportamental, terapia ocupacional, treinamento de habilidades sociais e psicoeducação, principalmente da família, são essenciais para os pacientes.
Conclusão
A esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico grave e crônico, devendo ser diagnosticado o mais rápido possível, buscando remissão e menor impacto no funcionamento dos pacientes.
É bastante caracterizada pela presença, em geral, de alucinações e delírios, discurso desorganizado, embotamento afetivo. O paciente diagnosticado costuma sofrer com grande psicofobia por ainda ser uma doença muito estigmatizada.
Porém, é passível de controle e remissão, com o uso de antipsicóticos, associados a terapia e psicoeducação.
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FONTES:
- HUMES, Eduardo; et. al. Clínica Psiquiátrica – Guia Prático. Instituto de Psiquiatria da USP. 1ª Ed. 2019.
- Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-V. American Psychiatric Association. 5ª Ed. 2014
- KAPLAN & SADOCK. Compêndio de Psiquiatria. 11ª Ed. 2017.