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Publicado em
12/5/22

Saiba como fazer a anamnese ginecológica da maneira correta

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Saiba como fazer a anamnese ginecológica da maneira correta

A anamnese ginecológica é feita na consulta ginecológica, sendo ela um instrumento importante para o diagnóstico da paciente. 

A anamnese é uma palavra que vem do grego (aná -trazer de novo- + mnesis -memória). 

Assim, quando realizada adequadamente, é responsável por “trazer à memória” todos os fatos relacionados com a doença e o paciente.

Além disso, é um instrumento que, quando bem-feito, promove decisões diagnósticas e terapêuticas corretas

Já quando não é realizada de forma adequada, pode cursar com diversas consequências negativas para o paciente, como a realização excessiva de exames complementares desnecessários.

Por isso, conhecer como realizar corretamente a anamnese ginecológica é fundamental na prática médica. 

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O que é a anamnese ginecológica?

A anamnese ginecológica é uma entrevista estruturada voltada para o reconhecimento de problemas de saúde e preocupações da paciente ginecológica.

Através dela, torna-se possível pensar em hipóteses diagnósticas consistentes, bem como realizar promoção da saúde.

Por que é importante realizar a anamnese ginecológica?

Para além da estruturação das informações para aventar a hipótese diagnóstica, o instrumento é fundamental para o desenvolvimento da relação médico-paciente.

Além disso, é comum que o único médico que a paciente acompanhe seja o ginecologista. Dessa forma, ele torna-se o “clínico” da mulher. 

Isso faz com que uma anamnese bem-feita promova também uma avaliação de outros sistemas, identificando-se assim alterações e fatores de risco para outras doenças importantes.

Como fazer a anamnese ginecológica?

Exemplo de ficha ambulatorial para atendimento da mulher. Essa ficha contém o roteiro da anamnese, bem como do exame físico. Fonte: https://semiologiamedica.ufop.br/
Exemplo de ficha ambulatorial para atendimento da mulher. Essa ficha contém o roteiro da anamnese, bem como do exame físico. Fonte: Universidade Federal de Ouro Preto

Inicialmente, é recomendado evitar a presença de acompanhantes, uma vez que esses podem deixar a paciente desconfortável para abordar aspectos íntimos e ligados a sua sexualidade.

E ainda, deve-se estimular a paciente a expressar todas as suas dúvidas e queixas, deixando-a confortável em abordar esses temas.

Como dito anteriormente, a anamnese deve seguir um roteiro estruturado. O Tratado de Ginecologia da FEBRASGO (2019), recomenda a estruturação da anamnese ginecológica da seguinte forma: 

  • Identificação
  • Queixa principal
  • História da doença atual (HDA);
  • Antecedentes pessoais;
  • História familiar; 
  • Antecedentes menstruais;
  • Antecedentes obstétricos;
  • Antecedentes sexuais e de métodos contraceptivos utilizados;
  • Antecedentes mamários; e
  • Antecedentes urinários e gastrointestinais.

Identificação

A anamnese ginecológica se inicia pela identificação, em que devem ser escritos o nome completo e não abreviado da paciente. 

E mais, deve-se registrar a idade, o estado civil, e a cor.  Além da profissão, religião, residência e procedência.

Essas informações irão auxiliar na identificação de possíveis doenças através da análise epidemiológica de suas prevalências fornecidas por esses dados. Observe o exemplo abaixo.

Ana Maria da Silva, 22 anos, branca, casada, autônoma, testemunha de Jeová, residente e procedente de Recife.

Queixa principal e duração

A queixa principal é o motivo que levou a paciente a procurar ajuda médica

Assim, nesse momento, pergunta-se o que trouxe a paciente ao médico, bem como a quanto tempo ela apresenta essa queixa. Aqui, devem ser anotadas as palavras exatas ditas pela mulher.

“Sangramento prolongado pela vagina” há 22 dias.

História da Doença Atual (HDA)

Aqui, deve-se caracterizar com uma base ampla as queixas referidas pela paciente. 

É preciso seguir uma estrutura “temporal”, abordando o início e a evolução de sua queixa principal

Recomenda-se que a análise da queixa principal tenha o seguinte esquema:

  •  Início dos sintomas;
  • Características do sintoma;
  • Fatores de melhora ou piora;
  • Relação com outras queixas;
  • Evolução;
  • Situação atual da queixa.

Nesse momento, devemos registrar todas as queixas, assim como todos os exames anteriormente realizados e possíveis medicamentos utilizados. Observe o exemplo abaixo.

Paciente relata que o sangramento iniciou poucas horas após correr 10km em uma corrida de seu bairro. Relata que o sangramento é leve, e que não encharca o absorvente, sendo necessário uso de um único absorvente durante o dia. Relata que o sangramento não é acompanhado de dor ou coágulos. Refere que o sangramento aumenta com a realização da atividade física, e melhora com o repouso. Sem outras queixas associadas. Houve redução do fluxo sanguíneo após parar completamente com as atividades físicas e, atualmente, não está mais sangrando. Além disso, paciente se queixa de ciclos menstruais longos e irregulares, tendo passado meses sem menstruar, com início desde a adolescência até os dias atuais. Nega dismenorreia.  

Antecedentes pessoais

Neste tópico da estrutura da anamnese ginecológica os questionamentos giram em torno das doenças prévias e medicamentos anteriormente utilizados pela mulher,  e cirurgias as quais ela já foi submetida.

Além disso, é preciso perguntar sobre possíveis hábitos, como tabagismo, álcool e drogas ilícitas, bem como reações alérgicas medicamentosas e de outros agentes alergênicos.

Paciente nega comorbidades e cirurgias prévias. Nega tabagismo, uso de álcool e outras drogas. Nega uso de medicação de forma contínua. Refere alergia à dipirona.

História familiar

Na história familiar, deve-se questionar a paciente sobre doenças familiares relevantes para ela.

Assim, entre outras coisas, procura-se a presença de neoplasia de mamas, intestinais e de ovários, especialmente em parentes de primeiro grau.

E mais, é imprescindível avaliar a idade do surgimento dessas neoplasias, especialmente as de mamas, porque pode exigir um rastreamento precoce.

Por fim, deve-se perguntar sobre antecedentes de outras doenças endócrinas, como hipertensão, diabetes mellitus e hipotireoidismo.

Refere história de neoplasia de mama (avó materna), que foi diagnosticada quando ainda era jovem (não sabe a idade). Relata história de diabetes mellitus tipo II (mãe), hipertensão arterial sistêmica (pai), acidente vascular cerebral (pai), síndrome dos ovários policísticos (mãe).

Antecedentes menstruais

Neste momento da anamnese ginecológica, questiona-se sobre idade da menarca, desenvolvimento cronológico e surgimento de caracteres sexuais secundários. Além da regularidade ou irregularidade dos ciclos menstruais

Assim, deve-se anotar a data da última menstruação (DUM) e observar a regularidade ou irregularidade dos ciclos.

Ademais, também é necessária a observação de sintomas associados, como a tensão pré-menstrual (TPM) e outras possíveis sintomatologias sistêmicas associadas.

Paciente refere menarca com 12 anos. Relata que ciclos são irregulares, com fluxo menstrual com duração de 3 dias e intervalo médio de aproximadamente 50 dias (3/50). Percebe o fluxo como normal.

Antecedentes obstétricos

Nesta etapa deve-se anotar o número de gestações, número e tipos de parto (vaginal ou cesáreo). 

Ex: G1P1A0 (paciente teve uma gestação, para um parto e nenhum aborto).

Também se faz necessário perguntar sobre possíveis abortamentos espontâneos ou induzidos e traumas genitais que podem ter ocorrido no momento do parto, além de possíveis complicações infecciosas. Por fim, é preciso questionar a paciente sobre seu período puerperal, lactação e/ou complicações.

Antecedentes sexuais e dos métodos contraceptivos utilizados

Para esta sessão, deve-se esclarecer de início, possíveis falhas e efeitos colaterais dos anticoncepcionais em uso e previamente utilizados.

A história sexual dependerá da situação individual da paciente. Deve-se anotar a idade da sexarca, bem como conhecer o número de parceiros(as) prévios(as) e a possíveis infecções sexualmente transmissíveis.

Além disso, são necessárias perguntas visando indentificar disfunções sexuais, como diminuição da libido, redução no grau da resposta sexual e/ou a impossibilidade de ter relações sexuais no atual relacionamento.

Antecedentes mamários

Nos antecedentes mamários, questiona-se sobre desenvolvimento das mamas, lactação e nódulos. E mais, possíveis dores, processos inflamatórios e traumas mamários prévios. 

Caso seja constatada a presença de nódulos, é imprescindível questionar a fase de desenvolvimento desses, e sua velocidade de surgimento e crescimento.

Caso a mulher tenha realizado exames de imagem, como mamografia e/ou ressonância, pergunta-se qual o motivo do exame e qual a sua sua indicação, assim como se ela já realizou biópsias mamárias e sobre o laudo histopatológico.

Queixas urinárias e gastrointestinais

Ao questionar sobre as queixas urinárias, deve-se perguntar sobre possível ocorrência e quantidade de infecções urinárias. Além das medicações utilizadas e o tempo de uso

E mais, questiona-se se há incontinência urinária ou urgência miccional

Sobre as queixas gastrointestinais, pergunta-se sobre possível intolerância gástrica e medicamentosa, ritmo intestinal, incontinência fecal, sangramentos e dores durante a evacuação.

Como realizar a anamnese ginecológica com adolescentes?

Ao realizar a anamnese ginecológica em pacientes adolescentes, é preciso esclarecer que a consulta será feita de forma sigilosa, e que as informações dadas somente poderão ser divididas com os familiares através da autorização dela.

Assim, a participação de outros familiares durante a consulta somente ocorrerá se for conveniente à paciente, respeitando seus direitos e pudores.

Dúvidas frequentes

Como fazer um roteiro de anamnese?

A Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) recomenda a estruturação do roteiro ginecológico da seguinte maneira:

  • Identificação
  • Queixa principal e duração (QPD)
  • História da doença atual (HDA)
  • Antecedentes pessoais
  • História familiar
  • Antecedentes menstruais
  • Antecedentes obstétricos
  • Antecedentes sexuais
  • Métodos contraceptivos utilizados
  • Antecedentes mamários
  • Queixas urinárias e gastrointestinais

Conclusão

A anamnese é um instrumento fundamental para a prática médica, e reconhecer como é a sua estrutura, bem como os pontos que devem ser abordados, é imprescindível para aumentar as chances de diagnosticar corretamente a paciente!

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