As valvulopatias são doenças que afetam as valvas do coração, cursando com disfunções morfológicas e funcionais. Assim, cursam com dificuldades de abertura e/ou fechamento.
São frequentes em países em desenvolvimento, como o Brasil, visto que uma importante etiologia é a infecção pelo Streptococcus pyogenes, que provoca a febre reumática.
Esse é o segundo post sobre essas doenças no blog, o anterior foi sobre valvulopatias mitrais. É também importante conhecê-las para aprofundar o seu conhecimento.
Neste post, daremos ênfase para as valvulopatias aórticas: a estenose e a insuficiência aórtica.
Epidemiologia e fatores de risco
Assim como nas mitrais, os principais fatores de risco para as valvulopatias aórticas são a febre reumática, anteriormente citada, e a idade avançada.
A idade avançada pode acarretar na degeneração valvar, cursando com calcificação dos anéis e folhetos valvares, restringindo seus movimentos.
Dessa forma, a estenose aórtica apresenta, atualmente, aumento de prevalência na população devido ao aumento da expectativa de vida. Por isso, acomete entre 3 e 5% da população com idade > 75 anos.
Assim, no Brasil, a estenose aórtica tem dois picos de incidência: um em pacientes jovens, devido a febre reumática, e outro na faixa etária idosa, por causas degenerativas.
Já a insuficiência aórtica, quando relacionada à etiologia reumática, incide principalmente em homens (3:1).
Fisiopatologia
Estenose aórtica
A estenose aórtica é caracterizada por obstrução do fluxo sistólico no ventrículo esquerdo para a aorta.
Nesse paciente é característico o achado patológico da abertura da valva em “boca de peixe”.
A principal etiologia da estenose aórtica é de causa degenerativa. Por isso, afeta principalmente idosos.
Outras causas são a valva aórtica bicúspide e a febre reumática. Entretanto, quando a condição ocorre pela febre reumática, comumente, há comprometimento da valva mitral associado.
Insuficiência aórtica
A insuficiência aórtica provoca sobrecarga no ventrículo esquerdo, resultando em estresse sistólico e dilatação ventricular.
Ela também ocorre devido a incompetência valvar secundária ou disfunção dos folhetos.
Assim, as principais causas de disfunção dos folhetos valvares são as sequelas da febre reumática, a endocardite infecciosa e as causas degenerativas.
Além disso, há também as malformações congênitas, como a valvulopatia bicúspide.
Já as principais etiologias para alteração do anel valvar aórtico são a dissecção de aorta descendente e as dilatações aneurismáticas, decorrentes da hipertensão arterial sistêmica e de doenças do colágeno, por exemplo.
Apresentações clínicas e complicações
O quadro clínico do indivíduo com valvulopatias aórticas é bastante variável, a depender se apresenta uma estenose ou insuficiência aórtica.
Quais os sintomas da estenose aórtica?
À ausculta cardíaca, evidencia-se sopro sistólico ejetivo com pico telessistólico e possível irradiação para o ápice cardíaco (fenômeno de Gallavardin). E ainda, hipofonese da primeira e segunda bulha.
Além disso, o pulso parvus et tardus é típico dessa condição, sendo caracterizado pela ascensão lenta e baixa amplitude.
Devido à dificuldade da passagem do sangue do coração para a circulação sistêmica, o paciente com estenose aórtica pode apresentar angina aos esforços e síncope.
Quais os sintomas da insuficiência aórtica?
Na ausculta cardíaca observa-se sopro diastólico aspirativo com timbre agudo característico. Quando ele ocupa toda a diástole (holodiastólico), indica gravidade da valvulopatia.
Por fim, é associado a insuficiência aórtica o pulso em martelo d’água, caracterizado por alta amplitude e curta duração.
Assista o vídeo abaixo para relembrar conceitos importantes da ausculta cardíaca anormal.
Como funciona o diagnóstico?
Assim, como nas valvulopatias mitrais, o eletrocardiograma (ECG) com 12 derivações deve ser solicitado, uma vez que detecta possíveis repercussões ventriculares nessas doenças.
Os padrões de sobrecarga ventricular esquerda associam-se a valvulopatias aórticas significativas.
O raio-X de tórax sempre deve ser solicitado. E o aumento do índice cardiotorácico indica sobrecarga de ventrículo esquerdo, e está associado a insuficiência aórtica.
E ainda, o ecocardiograma possibilita a realização do estudo funcional das válvulas, bem como avaliar a gravidade da lesão.
Por isso, é um exame primordial para o paciente com valvulopatia aórtica, e deve ser também solicitado para todos os pacientes.
Qual o tratamento para as valvulopatias aórticas?
O tratamento pode ser farmacológico ou intervencionista.
Entretanto, o tratamento farmacológico não muda o desfecho da doença, sendo utilizado para tratamento da sintomatologia do paciente.
Tratamento da estenose aórtica
Apenas indivíduos com estenose aórtica anatomicamente importante apresentam benefícios ao fazer o tratamento intervencionista.
Desse modo, a presença de sintomas como dispneia, angina e síncope são indicações formais para intervenção.
Sendo o implante de bioprótese aórtica transcateter (TAVI) uma opção à troca valvar cirúrgica, principalmente em pacientes frágeis e de alto risco.
Além disso, para os pacientes com estenose aórtica sintomática, recomenda-se de diurético de alça, sendo proscrita a utilização de beta-bloqueadores, devido aos efeitos inotrópicos negativos.
Tratamento da insuficiência aórtica
O surgimento de sintomas, redução da função sistólica e remodelamento excessivo do ventrículo esquerdo indicam pior prognóstico do paciente com insuficiência aórtica.
Por isso, são indicações de tratamento cirúrgico. Dessa forma, a cirurgia com troca valvar aórtica é a principal terapia intervencionista nesse paciente.
Já quando esse tipo de valvulopatia é sintomática, a associação de vasodilatadores e diuréticos é indicada.
Conclusão
As valvulopatias são um tema complexo na medicina. O médico generalista deve estar sempre atento à sintomatologia do paciente, bem como as possíveis alterações na ausculta cardíaca.
Por isso, procure se aprofundar mais nesse tema, e volte para esse texto sempre que precisar relembrar algum conceito importante!
Leia mais:
- Tetralogia de Fallot: O Que É, Diagnóstico e Tratamento
- Residência em Cardiologia: Mercado, Salário e Requisitos - 2022
- Hipertensão arterial: como fazer o diagnóstico?
FONTES:
- TARASOUTCHI, F., et al. Atualização das Diretrizes Brasileiras de Valvulopatias – 2020. Arq. Bras. Cardiol., v. 115, n. 4, p. 720-775, out 2020
- MARTINS, M. R. Manual do Residente de Clínica Médica. 2a edição. Barueri: Manole, 2017
- KUMAR, V. et al. Bases Patológicas das Doenças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016