A crise epiléptica é definida como as manifestações clínicas decorrentes da descarga neuronal excessiva, paroxística e síncrona dos neurônios corticais. É a ocorrência neurológica mais frequente na emergência pediátrica, representando 15% dos atendimentos pré-hospitalares de crianças com até 5 anos no Brasil.
Para realizar o atendimento adequado do paciente em crise epiléptica é fundamental reconhecer e tratar o estado de mal epilético (EME). Sendo ele caracterizado pelo tempo prolongado da crise epiléptica, com duração acima de 30 minutos, que pode suplantar os mecanismos orgânicos de manutenção da homeostase da criança.
As principais etiologias da crise convulsiva são as crises febris, a epilepsia e infecções do sistema nervoso central (SNC). Além disso, hipoglicemia, distúrbios eletrolíticos, traumatismo cranioencefálico e hemorragias intracranianas.
Fisiopatologia
Durante a crise epiléptica, há consumo de O2 e glicose e aumento da produção de lactato e CO2. Ademais, nas fases iniciais, o estímulo simpático provoca taquicardia, hipertensão e hiperglicemia.
Enquanto a ventilação do paciente for adequada, os riscos de dano neurológico e complicações sistêmicas são menores. Isso normalmente ocorre quando as crises são curtas. Entretanto, a criança com crise epiléptica pode ter dificuldade para manter a via aérea, tornando a ventilação insuficiente.
As consequências disso são a hipoxemia, hipercarbia (aumento da pressão de CO2) e uma acidose respiratória. Além do mais, quanto maior for o tempo da crise, maiores as chances de evolução para acidose lática, rabdomiólise e hiperpotassemia. E ainda, hipertermia e hipoglicemia.
Quadro clínico
Muitas vezes, a criança chega ao serviço de emergência já com o término da crise epiléptica. Nesse caso, é fundamental que o médico a diferencie de outras manifestações que podem mimetizar a crise.
Assim, alguns dados sugestivos de crise epiléptica são a presença de aura, movimentos tônicos, clônicos ou tônico-clônicos; movimentos anômalos nos olhos, perda da consciência e do controle dos esfíncteres. Para mais, no período pós-ictal (período após a crise convulsiva), a criança pode apresentar confusão mental, irritabilidade e fadiga.
Os movimentos tônicos são contrações musculares repentinas e duradouras, que provocam extensão e contração dos membros. Já os movimentos clônicos são movimentos de flexão e extensão dos membros.
Quando a criança chega à emergência em crise epiléptica, pode-se diferenciá-la de outras condições a partir dos seguintes achados: a crise não se altera ao se chamar atenção ou movimentar o paciente; a criança em crise não é capaz de localizar um estímulo doloroso nem manter reflexos de autoproteção.
Além disso, movimentos bilaterais na crise epiléptica caracterizam uma crise generalizada, que quase sempre cursa com perda da consciência. Se não há perda da consciência, as suspeitas de crise epiléptica diminuem.
No exame físico, é preciso avaliar os sinais vitais e procurar sinais de irritação meníngea. Outrossim, sinais de hipertensão intracraniana podem ser avaliados quando houver abaulamento de fontanela, bradicardia, hipertensão e edema de papila na fundoscopia. Ainda, sinais externos de trauma e de doenças sistêmicas crônicas também devem ser pesquisados.
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Diagnóstico
Não existem exames indicados para qualquer indivíduo que apresente uma crise epiléptica. A necessidade de exames complementares depende da história clínica dele, a exemplo da presença de doenças crônicas ou agudas, ou achados de alterações sugestivas de infecção do SNC.
Alguns exemplos de exames são a glicemia capilar à beira do leito, que deve ser feita em todo paciente com EME, além da avaliação de eletrólitos e a gasometria arterial. E mais, o hemograma e a hemocultura devem ser feitos sempre que houver suspeita de infecção.
A triagem toxicológica e a dosagem de drogas epilépticas também podem ser requisitadas, sendo essa última apenas para crianças que fazem uso dessas drogas habitualmente. Abaixo, encontra-se uma tabela com as indicações para exames do paciente em crise epilética.
Tratamento
O manejo inicial consiste em manter a cabeça em posição neutra, garantir via aérea pérvia, ventilação e circulação adequadas, oferecer oxigênio suplementar e realizar o acesso venoso.
Crises com duração de 3 a 5 minutos devem ser medicadas. A droga mais utilizada é o lorazepam, um benzodiazepínico, sendo indicada por suprimir rapidamente a atividade da crise convulsiva. A dose é de 0,05 a 0,1 mg/Kg, via endovenosa ou intramuscular, com dose máxima de 4mg/dose. A dose pode ser repetida por até 3 vezes até a resolução da crise.
Fonte:
BURNS, D. A. R. et al. Tratado Brasileiro de Pediatria: Sociedade Brasileira de Pediatria. Barueri,4. ed. –Barueri: Manole, 2017