O tétano é uma doença infecciosa aguda, relativamente rara, porém altamente letal e evitável com a imunização. Responsável por acometer o sistema nervoso central (SNC), ele gera espasmos musculares. No Brasil, o número de casos anuais varia de 500 a 600 casos, com taxas de 20% de mortalidade.
Neste post iremos abordar o tétano, sua transmissão, quadro clínico e manejo!
O que é o tétano?
O tétano é uma doença infecciosa aguda, não contagiosa, causada pela bactéria anaeróbia Clostridium tetani, que acomete o SNC e, por meio da ação de exotoxinas, gera espasmos musculares.
Etiologia e fisiopatologia
O agente causador do tétano, o Clostridium tetani, é um bacilo gram-positivo, esporulado anaeróbio, encontrado no solo. A infecção ocorre pela introdução de esporos em solução de continuidade de pele e mucosas (ferimentos). Após a inoculação, o patógeno se transforma em uma bactéria de haste vegetativa e produz a tetanospasmina metaloprotease (toxina tetânica).
A presença de tecidos desvitalizados, corpos estranhos, isquemia e infecção contribui para diminuir o potencial de oxirredução, tornando o ambiente mais favorável ao bacilo. Depois de atingir a medula espinhal e do tronco cerebral através do transporte axonal retrógrado e se ligar de forma irreversível aos receptores locais, a toxina bloqueia a neurotransmissão.
O efeito da toxina é a desinibição de neurônios que controlam impulsos excitatórios do córtex motor, o que resulta em aumento do tônus muscular, espasmos dolorosos e instabilidade autonômica generalizada. Esses efeitos são de longa duração e a recuperação exige crescimento de novos terminais dos nervos axonais.
A tetanolisina é outra toxina produzida pela bactéria do tétano, principalmente durante a fase inicial. Tem propriedades hemolíticas e provoca danos na membrana de outras células.
Como é feita a transmissão do tétano?
A doença pode ser adquirida acidentalmente - por meio de ferimentos na pele - ou de forma neonatal - através da manipulação do cordão umbilical por instrumentos inapropriados e não esterilizados.
O período de incubação pode variar aproximadamente entre 8 horas e 2 a 3 meses, sendo que a maioria dos casos ocorre entre o 3º e o 21º dia. O aparecimento de sintomas com menos de 7 dias de exposição é um fator prognóstico ruim.
Sintomas do tétano
O tétano tem seu quadro clínico caracterizado por febre baixa ou ausente, hipertonia muscular mantida, hiperreflexia e espasmos com contraturas paroxísticas. O tétano acidental pode ser dividido em 4 tipos: generalizado, localizado, cefálico e neonatal.
A gravidade e as manifestações clínicas podem variar de caso a caso, a depender da quantidade de toxina tetânica que atinge SNC.
Tétano generalizado
O tétano generalizado é a forma mais comum e grave. Mais de 50% dos casos, apresentam trismo (contração vigorosa do masseter), com dificuldade de abrir a mandíbula. Ele pode progredir para envolvimento da musculatura cervical, com disfagia e contratura de ombros, dorso, musculatura abdominal e região proximal dos membros.
Os espasmos são dolorosos e progressivamente mais frequentes e intensos. Essas contrações são intensas a ponto de causarem fraturas e prejudicarem a ventilação do paciente. Esses espasmos podem ser desencadeados por ruídos altos ou outros estímulos sensoriais.
Achados clássicos incluem torcicolo espasmódico, opistótono, riso sardônico (envolvimento da musculatura facial), disfagia, períodos de apneia por obstrução das vias aéreas por contração muscular e abdome em tábua. Inicialmente, a hiperatividade autonômica pode se manifestar com irritabilidade, agitação, sudorese e taquicardia.
Tétano localizado
Ocasionalmente, o tétano pode se expressar de forma localizada, com espasmos tônicos em uma extremidade ou região do corpo. Podendo evoluir para forma generalizada. Por isso, o diagnóstico é mais difícil.
Tétano cefálico
É a forma mais importante do tétano localizado, ocorrendo frequentemente em pacientes com ferimentos em cabeça e pescoço. No tétano cefálico muitas vezes os sintomas podem ser de envolvimento dos nervos cranianos, sendo o nervo facial o mais comumente envolvido.
Tétano neonatal
O tétano neonatal ocorre tipicamente em recém-nascidos de 5 a 7 dias após o nascimento. O início geralmente é mais rápido e pode progredir ao longo de horas, provavelmente porque as fibras axonais são menores.
Apresenta-se inicialmente com recusa alimentar, dificuldade de abrir a boca devido trismo, sorriso sardônico, mãos apertadas, pés dorsiflexionados, tônus muscular aumentado. Para mais, pode evoluir para rigidez e opistótono.
Diagnóstico do tétano
O diagnóstico do tétano é clínico e deve ser pensado quando o quadro clínico for sugestivo, associado a história de lesão de risco e imunização inadequada.
Os exames laboratoriais costumam ser inespecíficos e realizados apenas para monitorização de complicações. A CPK deve ser solicitada para acompanhar a possibilidade de rabdomiólise associada. Além disso, deve-se solicitar hemograma, eletrólitos e função renal.
Tratamento para o tétano
É recomendado o internamento em UTI de todos os pacientes, com manejo precoce das vias aéreas.
Interrupção da produção de toxinas
Para interrupção da produção de toxinas e neutralização, utiliza-se a imunoglobulina antitetânica ou soro antitetânico para evitar progressão da doença. A preferência é pela imunoglobulina antitetânica por via intramuscular profunda 500 a 5000 UI, de preferência distante da ferida. O soro antitetânico pode ser feito em dose de 20.000 a 30.000 UI intramuscular, em dois grupos musculares diferentes.
Cerca de 1 a 6 horas depois da aplicação pode-se realizar o desbridamento da ferida para erradicar os esporos e o tecido necrosado.
Antibioticoterapia
A terapia recomendada é com metronidazol 500mg EV de 6/6h ou 8/8h, porém pode ser feito também a penicilina G 2-4 milhões UI EV de 4/4h ou 6/h. A duração do tratamento deve ser de 7 a 10 dias.
Manejo das vias aéreas
O manejo de vias aéreas deve ser agressivo, com intubação orotraqueal precoce. A traqueostomia é recomendada precocemente após ventilação mecânica.
Controle dos espasmos musculares
Deve-se buscar controle da luz e do som e o uso de bloqueadores neuromusculares. Os benzodiazepínicos são as drogas de escolha, recomenda-se o Diazepam 30mg EV em 24h (5mg a cada 4h). Pode ainda, associar a eles, rocurônio ou vecurônio. Outra opção aos benzodiazepínicos é o baclofeno ou o propofol.
Manejo da disautonomia
Em pacientes com disfunção autonômica, recomenda-se o uso do sulfato de magnésio, para diminuir a necessidade de ventilação mecânica e a necessidade de outras drogas. A dose inicial é de 40mg/kg em 30 minutos, seguido por infusão contínua de 2g por hora, se o paciente tiver mais de 45kg.
Fisioterapia
Recomenda-se fisioterapia assim que os espasmos cessem, para evitar sequelas da imobilização prolongada.
Prevenção contra o tétano
Vacinação
O esquema vacinal completo recomendado pelo Ministério da Saúde é de 3 doses no primeiro ano de vida, com reforço aos 15 meses e 4 anos de idade. A partir dessa idade, um reforço a cada 10 anos.
Em casos de ferimentos graves ou gestação, deve-se antecipar a dose de reforço caso a última dose tenha sido há mais de 5 anos.
Além disso, o tétano não confere imunidade após a recuperação da doença aguda. Então, todos os pacientes após curados devem receber as 3 doses da vacina dT, com pelo menos 2 semanas de intervalo, em um local diferente da aplicação da imunoglobulina.
Profilaxia após ferimento
A profilaxia do tétano após um ferimento vai depender do tipo de ferimento e do status imunológico do paciente, como pode ser visto a seguir:
Conclusão
O tétano é uma doença infecciosa rara, porém, potencialmente grave, com altas taxas de mortalidade. É caracterizada por quadro de espasmos musculares, sem alteração nos níveis de consciência, que podem potencialmente evoluir para obstrução das vias aéreas. O diagnóstico é clínico e baseado na história clínica e vacinal.
O tratamento é feito por meio do uso de imunoglobulinas ou soro antitetânico, antibióticos, benzodiazepínicos para controle da contratura muscular, sulfato de magnésio e medidas de suporte.
Leia mais:
- Sífilis: o que é, sinais e sintomas, quais os tipos e como tratar
- Impetigo: o que é, causas, sintomas e tratamentos
- A osteomielite vertebral é mais observada em homens
FONTE:
- VELASCO, Irineu; et. al. Medicina de Emergência – Abordagem Prática. 15ª edição. 2022. Medicina USP.