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Publicado em
24/4/25

Escabiose na prática médica: sintomas, causas e manejo

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Escabiose na prática médica: sintomas, causas e manejo

A Escabiose é uma das condições dermatológicas mais comuns nas unidades básicas de saúde no SUS. Está intimamente associada à epidemiologia brasileira devido às nossas características sanitárias, prevalecendo na população economicamente desfavorecida e com baixas condições de higiene, tornando-a uma condição negligenciada por ter esse perfil de acometimento. Vamos relembrar suas formas clínicas e seu manejo?

O que é escabiose? Entenda a sarna humana e seu impacto clínico

A escabiose, popularmente conhecida como sarna (apesar deste termo estar caindo em desuso pelo estigma social), é uma doença de pele altamente contagiosa causada pela infestação do ácaro Sarcoptes scabiei var. hominis. Sua transmissão ocorre principalmente por contato direto e prolongado com a pele de uma pessoa infectada, sendo comum em ambientes com aglomeração de pessoas, como nas residências, escolas, creches, lar geriátricos e presídios.

Do ponto de vista epidemiológico, é um importante problema de saúde pública, especialmente em regiões com precariedade de condições sanitárias. Em 2009, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a escabiose como uma doença de pele negligenciada, com alta prevalência e impacto desproporcional em populações vulneráveis. Estima-se que mais de 200 milhões de pessoas estejam infectadas em todo o mundo atualmente. 

Escabiose: como o sarcoptes scabiei causa a infestação cutânea?

A escabiose é causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei var. hominis, um ectoparasita da classe Arachnida. É um ácaro exclusivamente humano, ou seja, sua transmissão ocorre apenas entre pessoas. Os casos relacionados a animais, como na sarna sarcóptica animal, infestam de verdade humanos e, caso haja sintoma, ele tende a desaparecer com o afastamento do contato com o animal.

Imagem da visualização em microscópio do Sarcoptes scabiei var. homini
Sarcoptes scabiei var. hominis. Fonte: Prevent and Protect

A fisiopatologia da escabiose envolve o ciclo de vida do ácaro dentro da epiderme. Após o acasalamento na pele, a fêmea escava túneis onde deposita ovos. Esses ovos eclodem e eventualmente atingem a fase adulta. Todo o ciclo de vida dura cerca de 2 a 3 semanas. Durante esse processo, enzimas proteolíticas são secretadas, facilitando a penetração na epiderme e provocando lesão nos queratinócitos, o que contribui para a resposta inflamatória e o prurido característicos da doença.

Nas infestações primárias, o tempo de incubação pode variar de 2 a 5 semanas, enquanto nas reinfecções, os sintomas aparecem em poucos dias. A resposta imune do hospedeiro, especialmente em reinfestações, costuma ser mais rápida e intensa, levando a manifestações clínicas mais evidentes com menor carga parasitária. 

Prurido noturno e pápulas eritematosas: quando suspeitar de escabiose?

A escabiose apresenta-se clinicamente em três formas principais: clássica, nodular e crostosa (também chamada de sarna norueguesa). A forma clássica é a mais comum, com carga parasitária baixa e exige contato direto e prolongado para ocorrer a transmissão. A forma nodular é caracterizada por nódulos eritematosos pruriginosos, principalmente nas axilas e virilha, sendo atribuída a uma reação de hipersensibilidade ao ácaro. 

Por fim, a escabiose crostosa ocorre tipicamente em indivíduos imunocomprometidos (seja por HIV, diabetes ou em uso de imunossupressores) e pode envolver uma superpopulação de ácaros, aumentando exponencialmente sua possibilidade de transmissão, essa podendo acontecer até por contato breve ou por fômites, como roupas e lençois.

Escabiose Clássica

Imagem mostrando detalhadamente o túnel cutâneo da escabiose
Túnel cutâneo da escabiose. Fonte: MPDI

O prurido noturno intenso é o sintoma mais constante e característico da escabiose clássica e acontece por uma reação imunológica de hipersensibilidade do tipo IV. Surgem pápulas eritematosas de pequeno tamanho, acompanhadas de marcas de escoriações provocadas pelo ato de coçar. Um achado mais específico, embora nem sempre visível, são os túneis escavados pelos ácaros, que se mostram como linhas finas e esbranquiçadas. 

Além das pápulas, também podem ocorrer vesículas, pústulas e, em crianças pequenas, até bolhas. As lesões costumam se distribuir de maneira simétrica, acometendo principalmente os espaços interdigitais das mãos, superfícies flexoras dos punhos, superfícies extensoras dos cotovelos, axilas, região periumbilical, linha da cintura, aréolas mamárias, genitália masculina, nádegas, coxas e pés. Em adultos, o dorso geralmente é poupado, assim como o couro cabeludo. 

Imagem caracterizando a escabiose clássica
Escabiose clássica. Fonte: NHS

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Escabiose Nodular

Imagem mostrando a escabiose Nodular
Escabiose Nodular. Fonte: Research Gate

A escabiose nodular representa uma variante da forma clássica e se caracteriza por nódulos ou pápulas firmes, de coloração eritematosa e extremamente pruriginosos Esses nódulos atingem mais regiões como virilha, genitália, axilas e nádegas. São considerados resultado de uma resposta imunológica persistente ao ácaro, ativo ou já erradicado, e podem permanecer mesmo após o tratamento adequado, tornando-se um desafio clínico em alguns casos.

Escabiose Crostosa

Já a escabiose crostosa, também conhecida como escabiose norueguesa, é uma forma grave  que ocorre em pacientes com comprometimento imunológico. Clinicamente, inicia-se com placas eritematosas de bordas mal definidas, que evoluem para escamas grossas, crostosas e aderentes. As áreas mais frequentemente afetadas incluem couro cabeludo, mãos e pés, mas o quadro pode se generalizar.

Exemplo de escabiose crostosa
Escabiose crostosa. Fonte: DermNet

As crostas podem se tornar verrucosas, com fissuras e odor desagradável. As unhas podem ficar espessadas, descoloridas e distróficas. Apesar da gravidade da infestação, o prurido pode ser ausente ou discreto.

Diagnóstico da escabiose: como confirmar?

Embora o diagnóstico clínico seja frequentemente suficiente para a escabiose, métodos laboratoriais podem ser usados para confirmação. O padrão-ouro é a raspagem de pele (“skin scraping”) seguida de exame microscópico, buscando identificar diretamente o ácaro, seus ovos ou suas fezes. Entretanto, a sensibilidade desse método varia entre 46% e 90%, com elevada especificidade. 

Nos últimos anos, métodos não invasivos vêm ganhando espaço. A dermatoscopia, amplamente disponível em consultórios dermatológicos, permite identificar estruturas típicas como o “sinal da asa delta”  triângulo escuro correspondente à parte anterior do ácaro dentro do túnel. Essa técnica é útil tanto para o diagnóstico inicial quanto para guiar locais ideais de raspagem.

Imagem mostrando o sinal da Asa delta na Dermatoscopia
Sinal da Asa delta na Dermatoscopia. Fonte: Research Gate

Outras ferramentas incluem a biópsia cutânea, que é reservada para casos atípicos ou de difícil diagnóstico. Apesar dessas possibilidades, a maioria das escabioses são manejadas a nível de atenção básica no SUS, o que faz com que o diagnóstico ocorra majoritariamente pela coleta de uma história clínica compatível e pela inspeção cutânea ao exame físico.

Tratamento da escabiose: como escolher o melhor esquema terapêutico?

O tratamento da escabiose envolve o uso de medicamentos tópicos e sistêmicos, sendo as opções mais utilizadas a Permetrina tópica 5% e a Ivermectina oral. A escolha do tratamento depende de fatores como a gravidade do quadro, a idade do paciente, condições especiais (como gravidez), e o contexto epidemiológico, sendo a Permetrina tópica 5% considerada o tratamento de primeira linha. Ela é aplicada na pele desde o pescoço até a planta dos pés e deve agir de 8 a 14 horas. Uma segunda aplicação é recomendada após uma ou duas semanas. 

A Ivermectina oral tem ganhado destaque pela sua praticidade, especialmente em surtos institucionais, onde a aplicação tópica pode ser difícil de implementar. A dose padrão é de 200 mcg/kg, repetida após uma ou duas semanas. Deve ser evitada em gestantes e crianças com menos de 15 kg. A vantagem da ivermectina está na maior taxa de adesão, menor risco de aplicação inadequada e facilidade em tratar múltiplos casos simultaneamente.

Falhas no tratamento são frequentes e geralmente decorrem da não adesão ao regime terapêutico, da não desinfecção de roupas e roupas de cama, ou da ausência de tratamento simultâneo dos contatos próximos. 

Por fim, medidas gerais e não farmacológicas do manejo da escabiose incluem o tratamento simultâneo de todos os contatos próximos, mesmo que estejam assintomáticos. Também é importante lavar roupas de cama, toalhas e roupas utilizadas nos três dias anteriores ao tratamento em água quente e secá-las em alta temperatura. A higienização cuidadosa do ambiente também faz parte desse grupo de medidas.

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