A endometrite é uma inflamação do endométrio, geralmente de origem infecciosa, que pode ocorrer em diferentes contextos clínicos. Essa condição tem importância significativa na prática ginecológica e obstétrica, sendo uma das principais complicações do puerpério e de procedimentos intrauterinos. A identificação precoce e o manejo adequado são essenciais para evitar complicações como infertilidade, doença inflamatória pélvica e sepse.
O que é a endometrite?
![Esquematização da endometrite](https://cdn.prod.website-files.com/5f7c5ad0f02de81be2e6417c/67a6572c3f51dfc09a06c0e9_AD_4nXeKZjbzwi6JHxof6OkjCRyATWZvZmZ1-OM9iSOMnskwjNXu4nhlgZRDhfeTbEi8qLYohoSD4pwdAs4CfDP9yHzcliafxNogJus4rV4ZZxUQYLgE5HM8vo_QNrzYC0yD8DB2CBqd.png)
A endometrite é definida como a inflamação do tecido endometrial, podendo ser classificada como aguda ou crônica. A forma aguda está geralmente associada a infecções bacterianas polimicrobianas, enquanto a crônica pode ter uma etiologia infecciosa ou não infecciosa, muitas vezes relacionada à presença de microrganismos intracelulares, como Chlamydia trachomatis e Mycoplasma hominis.
Fatores de risco
Diversos fatores podem predispor ao desenvolvimento da endometrite, incluindo parto vaginal ou cesariana, especialmente quando há ruptura prolongada de membranas ou trabalho de parto prolongado, além de procedimentos intrauterinos, como biópsia endometrial, histeroscópica, inserção de dispositivo intrauterino (DIU) e curetagem uterina.
Infecções pélvicas prévias ou recorrentes, doença inflamatória pélvica, presença de tecido placentário residual pós-parto ou pós-aborto, imunossupressão e condições que comprometem a resposta imune também são fatores predisponentes. Além disso, a infecção sexualmente transmissível (IST) e más condições higiênicas durante o parto aumentam o risco da doença.
O que causa a endometrite?
A endometrite geralmente tem uma etiologia polimicrobiana, sendo causada por patógenos ascendentes do trato genital inferior. Os microrganismos mais frequentemente envolvidos incluem Escherichia coli, Streptococcus agalactiae (EGB), Gardnerella vaginalis, Mycoplasma hominis, Ureaplasma urealyticum, Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, além de anaeróbios, como Bacteroides spp. e Peptostreptococcus spp.
Veja também:
- Veja como é a rotina da residência médica em Ginecologia e Obstetrícia no CISAM-UPE
- O que é Residência em Ginecologia e Obstetrícia, áreas de atuação, rotina, habilidades e remuneração
- Os principais casos ginecológicos que acometem mulheres no HMR com Drª Amanda Truta
Sintomas de endometrite
![Imagem de exame ginecológico mostrando o colo do útero e o corrimento amarelo esverdeado com bolhas](https://cdn.prod.website-files.com/5f7c5ad0f02de81be2e6417c/67a6572cb13d2bab62482a21_AD_4nXdXmAHFmQlq_tZK-cfG2fG3D3MD0ySxKdSo6ZtK4iaxU95brY-eSMKX3z-xDQCdPtTvvl39Mv8Ycfkuby9_fJ0yakiGxqs9vn100vOrPadASVO9R7TMmLd_RHwvd06IaQ20tlkVDQ.png)
Os sinais e sintomas da endometrite podem variar de acordo com a gravidade e a etiologia da infecção. A febre, geralmente superior a 38°C, é uma manifestação comum, especialmente no período puerperal. A dor pélvica pode ser difusa ou localizada e está associada à sensibilidade uterina à palpação. O corrimento vaginal fétido e purulento é uma característica marcante da infecção, assim como o sangramento uterino anormal, que pode se manifestar como metrorragia ou menorragia, principalmente nos casos crônicos. Além disso, os pacientes podem apresentar sintomas sistêmicos, como mal-estar, fadiga e sudorese excessiva, que indicam uma resposta inflamatória mais extensa.
Como realizar o diagnóstico?
O diagnóstico é essencialmente clínico, baseado na presença de febre, dor pélvica e sinais de infecção uterina. No entanto, exames complementares podem auxiliar na confirmação e na exclusão de diagnósticos diferenciais. O hemograma geralmente revela leucocitose com predomínio de neutrófilos, refletindo uma resposta inflamatória sistêmica. Marcadores inflamatórios, como proteína C-reativa (PCR) e velocidade de hemossedimentação (VHS), tendem a estar elevados, indicando uma resposta inflamatória mais intensa. A ultrassonografia transvaginal é um exame de imagem fundamental para avaliar a presença de restos placentários, abscessos ou espessamento endometrial sugestivo de inflamação.
![Aspecto ultrassonográfico de produtos retidos com sinais de endometrite . Identifica-se grande quantidade de produtos retidos com imagem de gás na região fúndica](https://cdn.prod.website-files.com/5f7c5ad0f02de81be2e6417c/67a6572cdb5823d35fe5a63b_AD_4nXc4hkzzmqvjtXTFHHMqSd5kgJzBqFufMY9iYfHOTlmPA_RTyA-gcw-SndHNDN2JfAXDhcbIr-up2szGSOORgCplyRGNWopg9npfQMvIe5Nn-rw8ImYbJw3a4gqK6TJWnVumGVRKOA.png)
Nos casos de suspeita de endometrite crônica, a biópsia endometrial pode ser necessária, permitindo uma análise histopatológica detalhada e cultura microbiológica para identificação do agente causal. Culturas endocervicais e testes para ISTs são recomendados em pacientes com fatores de risco para ISTs, pois podem identificar patógenos como Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae, que exigem tratamento específico. A histeroscopia diagnóstica pode ser útil nos casos de endometrite crônica persistente, permitindo a visualização direta do endométrio e a obtenção de amostras para análise.
Como tratar a endometrite?
O tratamento da endometrite varia de acordo com a etiologia e gravidade da infecção.
Endometrite aguda puerperal
Em casos de endometrite aguda puerperal, a antibioticoterapia empírica intravenosa deve ser iniciada com um regime de amplo espectro, como a associação de clindamicina e gentamicina, que cobrem anaeróbios e gram-negativos. Em quadros mais graves, pode ser necessária a adição de ampicilina para ampliar a cobertura contra Enterococcus spp.
Endometrite não puerperal
Na endometrite não puerperal, o tratamento ambulatorial pode ser realizado com doxiciclina, administrada na dose de 100 mg duas vezes ao dia por 14 dias, associada a metronidazol para garantir a cobertura de anaeróbios e patógenos intracelulares. Casos mais graves exigem hospitalização e antibioticoterapia intravenosa para um controle mais eficaz da infecção. Quando há presença de tecido residual no útero, evidenciado por exames de imagem ou sinais clínicos persistentes, a curetagem uterina pode ser necessária para remoção de restos placentários ou produtos de concepção.
Endometrite crônica
Já a endometrite crônica pode demandar tratamento específico com antibióticos direcionados conforme a cultura e, em alguns casos, o uso de anti-inflamatórios para redução da inflamação persistente do endométrio. O acompanhamento clínico rigoroso é fundamental para evitar recorrências e complicações tardias.
Conclusão
A endometrite é uma condição inflamatória relevante na prática ginecológica e obstétrica, exigindo um alto grau de suspeição clínica para um diagnóstico precoce e tratamento adequado. A abordagem multidisciplinar, considerando fatores de risco, manifestações clínicas e exames complementares, é fundamental para um manejo eficaz, prevenindo complicações graves, como infertilidade e sepse. O tratamento deve ser individualizado, levando em consideração a gravidade do quadro e a presença de possíveis complicações associadas.
Leia Mais:
- Prolapso dos órgãos pélvicos: tipos, classificação e tratamento
- Fraturas Pélvicas: tipos, como diagnosticar e tratar
- Clamídia: fisiopatologia, fatores de risco, sintomas e como tratar
- Candidíase vulvovaginal: o que é, sintomas e como tratar
- Leiomioma uterino: você domina o manejo?
FONTES:
- Cunningham, F.G., Leveno, K.J., Bloom, S.L., et al. Williams Obstetrics, 25th ed. McGraw Hill, 2018.
- Rotinas em ginecologia. 8. ed. [S. l.: s. n.], 2023.