A condição de abdome agudo é uma emergência relativamente comum, com diversas possíveis etiologias, que pode ser dividido em subtipos: inflamatório, obstrutivo, vascular, perfurativo e hemorrágico. O abdomen agudo de origem inflamatória pode também estar associado a processos infecciosos na cavidade peritoneal. Vamos destrinchar as causas, sintomas e tratamento dessa afecção aguda!
O que é Abdome Agudo Inflamatório?
O abdome agudo inflamatório é uma emergência, que pode ter ou não caráter cirúrgico, que surge por uma inflamação e infecção de alguma estrutura intra-abdominal. Vamos revisar abaixo as principais causas de abdome agudo, baseado nos grupos etiológicos:
Fisiopatologia
A apresentação clássica do abdome agudo inflamatório ocorre devido à dupla-inervação da cavidade abdominal, sendo elas a Visceral e Somática. A inervação visceral age em nome do sistema nervoso autonômico, com nervos sensíveis à distensão, inflamação, isquemia, e à peristalse dolorosa realizada pela musculatura lisa gastrointestinal, popularmente conhecida como cólica.
A caracterização dessa dor visceral é de localização imprecisa, profunda e romba. Ela apresenta grande irradiação, baseado no local de origem: órgãos do andar superior do abdômen, como fígado, estômago pâncreas e vias biliares, irradiam para o epigástrio; órgãos em região média do abdômen, como intestino delgado e apêndice, irradiam para a região periumbilical; e órgãos mais inferiores, como reto e intestino grosso, irradiam para hipogástrio e fossas ilíacas.
Por sua vez, a sensibilidade somática fornece informações sensitivas da camada parietal do peritônio. Ela será descrita como de localização facilmente identificável e de característica mais aguda. Essa dor é mais indicativa de irritação peritoneal. O Sinal de Blumberg, visto pela descompressão abrupta do ponto de McBurney, é um forte indicativo dessa condição.
Causas de abdome agudo inflamatório
Apendicite
A apendicite é uma condição caracterizada pela inflamação aguda do apêndice vermiforme, localizado na fossa ilíaca direita. A sua apresentação se inicia de maneira inespecífica, com dor periumbilical, vômitos, náuseas, se agudizando nas primeiras 24 horas com localização precisa em região inguinal direita do tipo cólica e com sinal de Blumberg positivo. É rara a apresentação crônica da condição.
Colecistite Aguda
É a inflamação da vesícula biliar, frequentemente sendo causada por uma obstrução de ductos por cálculos biliares, que caracterizam a coledocolitíase. Nesse caso, o paciente apresenta história prévia de episódios de cólicas biliares e piora com a ingestão de alimentos gordurosos. Além disso, também pode referir alteração de coloração de fezes e até icterícia.
Pancreatite Aguda
A inflamação aguda do pâncreas geralmente decorre de obstrução dos ductos pancreáticos por litíase biliar (caso obstrua o esfíncter de Oddi), alcoolismo, infecções virais, traumas ou condições genéticas. Em casos de manejo inadequado, essa patologia pode evoluir para uma insuficiência e necrose pancreática, infecções secundárias e disfunções de órgãos adjacentes.
Diverticulite
A diverticulite é uma complicação de uma condição já existente, a diverticulose. Essa se caracteriza pelo surgimento de saculações em intestino grosso, especialmente em sua porção sigmoide. A diverticulose não é necessariamente patológica, uma vez que pode não causar repercussões clínicas e funcionais. Porém, uma vez que uma dessas saculações inflama, existe um risco de rompimento com peritonite, além de quadro sintomatológico exuberante.
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Quais os sintomas de abdome agudo inflamatório?
A dor abdominal, caracterizada por sua intensidade súbita, frequentemente localiza-se em áreas específicas e pode se tornar mais difusa à medida que a condição progride. A sensibilidade ao toque é notável, acompanhada por rigidez na parede abdominal, reflexo da irritação peritoneal associada à inflamação. Náuseas e vômitos são comuns, evidenciando a resposta inflamatória nos órgãos abdominais.
Alterações nos movimentos intestinais, como constipação ou diarreia também podem ser sinais sugestivos. A presença de febre sugere uma resposta inflamatória sistêmica, enquanto a distensão abdominal pode ocorrer devido à inflamação e acúmulo de líquidos. Alterações nos sinais vitais, como aumento da frequência cardíaca e respiratória podem ocorrer em casos mais graves.
Existem alguns sinais que servem de orientadores da hipótese diagnóstica de abdome agudo inflamatório, como por exemplo: se houver irradiação para o dorso, é característico de pancreatite, caso haja piora após ingesta alimentar, principalmente alta em lipídios, pensar em colecistite, assim como a icterícia. Além disso, é necessária a associação com faixa etária, visto que apendicite é comumente vista em jovens, enquanto diverticulite é característica do paciente mais senil.
É importante ressaltar que, apesar de não ser regra, uma vez que exista um quadro de dor localizada com febre no abdome agudo, a primeira hipótese diagnóstica dentre subgrupos é de abdome agudo inflamatório.
Diagnóstico
Exames laboratoriais
Não existe uma rotina laboratorial para abdome agudo inflamatório, uma vez que a investigação deve ser direcionada de acordo com as hipóteses levantadas durante a anamnese e exame físico. Dentro das etiologias mais comuns de abdome agudo inflamatório, leucograma, amilase, lipase e bilirrubinas são essenciais.
Vamos ver abaixo o que pode ser identificado baseado nos parâmetros solicitados e quais serão as condições que poderiam estar gerando a alteração:
Exames de imagem
No abdome agudo inflamatório, a ultrassonografia é de grande valor, uma vez que é um exame simples, barato, de fácil acesso, livre de radiação e de possível repetição frequente. Condições bem vistas pela USG são: colecistite, DIPA, rotura de gravidez tubária, apendicite aguda, coleções e abscessos intraperitoneais. Sua limitação está na avaliação retroperitoneal, além da dificuldade de visualização em casos de distensão abdominal e grande volume gasoso.
Já a Tomografia Computadorizada é de boa visualização independente da localização do órgão afetado, assim, avaliando bem o retroperitônio. Ademais, ela é capaz de demonstrar as possíveis complicações envolvidas, como alguma perfuração e áreas isquêmicas. Sua limitação é seu custo, a utilização de radiação (evitando exposições frequentes ao paciente) e a necessidade da estabilidade clínica e hemodinâmica para a realização.
Como tratar?
Visto que o tratamento depende da condição em questão, vamos focar nas 4 mais relevantes do abdome agudo inflamatório:
Apendicite Aguda
Via de regra, o tratamento de escolha para apendicite é a sua remoção na Apendicectomia, seja ela por laparotomia ou laparoscopia (dependendo da estabilidade clínica do paciente). Existe um procedimento pouco utilizado na prática, que é o tratamento de casos leves de apendicite com antibiótico, porém não tem sua eficácia bem estabelecida. Ademais, pacientes submetidos a cirurgia também receberão antibiótico.
Colecistite Aguda
O manejo da colecistite aguda deve conter drogas analgésicas, antibióticos (cobertura para Gram negativos, Gram positivos e anaeróbios) e cirurgia precoce (entre 48h a 72h da instalação). Caso o paciente busque atendimento em apresentação tardia, indica-se cirurgia em 6 a 10 semanas após a resolução do quadro.
Diverticulite
O tratamento da diverticulite dependerá da sua gravidade. Casos oligossintomáticos, assintomáticos e sem fatores de risco serão manejados a nível domiciliar, com antibioticoterapia e dieta líquida. Já os quadros com sintomas mais expressivos, fatores de risco, leucocitose e peritonite, o tratamento será com internamento, antibioticoterapia e avaliação de necessidade de retossigmoidectomia. A Classificação de Hinchey também é usada, veja abaixo:
Conclusão
A abordagem ágil e diferenciada do abdome agudo inflamatório, considerando suas variadas etiologias, é necessária para garantir diagnóstico correto e intervenção adequada. É importante a boa compreensão dos sinais clínicos, laboratoriais e de imagem na diferenciação das condições de base causando o abdômen agudo.
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FONTES: