A promoção da saúde de mães e recém-nascidos, e assim a saúde das próximas gerações, é uma prioridade de saúde pública em todo o mundo. No Brasil, o excesso de intervenções que antecipam o parto, como cesarianas e induções, tem resultado no encurtamento do período gestacional, podendo ocasionar desfechos negativos materno-infantis.
A indução do trabalho de parto e a cesariana são recursos essenciais para melhorar as taxas de morbimortalidade materna e neonatal. Todavia, quando a proporção de cesarianas em uma população ultrapassa 10% a 15%, suas desvantagens tendem a superar os potenciais benefícios, especialmente quando realizadas antes do início espontâneo do trabalho de parto e das 39 semanas completas de gestação. Esse é o caso do Brasil, onde a idade gestacional no parto tem diminuído, como resultado da superestimação da segurança de intervenções associadas à abreviação da gravidez.
Consequências
Em termos de consequências a longo prazo acerca de intervenções perinatais, evidências sólidas mostram que a cesárea está associada a um risco aumentado de doenças crônicas na infância, como asma, diabetes, obesidade, hipertensão, artrite, problemas neurológicos, alergias e certos tipos de câncer, como leucemia.
Também há evidências crescentes de um efeito dose-resposta invertido entre idade gestacional em recém-nascidos a termo e o risco de atrasos no desenvolvimento. Estudos mostram que, mesmo controlando variáveis de confusão relacionadas a aspectos sociodemográficos e à morbidade materna, ter nascido por uma cesariana eletiva, ainda que no período de termo, está associado com pior desempenho escolar em linguagem e matemática.
Qual o termo ideal?
Por várias décadas, o período de “termo”, compreendido entre 37 e 42 semanas de gestação, foi tratado como uma categoria homogênea, pois se acreditava que o nascimento poderia ocorrer ou ser provocado de maneira segura e sem riscos adicionais a partir do seu início (37 semanas completas).
Atualmente entendesse que o conceito binário tradicional, termo versus pré-termo, pode mascarar o efeito contínuo da imaturidade fetal como preditora de resultados negativos. Por esse motivo, a Universidade de São Paulo tem desenvolvido uma medida inovadora de idade gestacional, uma variável contínua chamada “dias potenciais de gravidez perdidos” (DPGP), contando os dias faltantes desde a data do nascimento até a data em que se
completaria a duração média da gestação (280 dias), usando dados de registros de nascimentos do Sistema de Informações de Nascidos Vivos (Sinasc).
Conclusão
A partir do momento em que se reconhece que cada dia de gestação conta na saúde e no bem estar perinatais, deve-se avançar no sentido de um “cuidado livre de danos”, tornando visível não apenas o número de dias e semanas de gestação perdidos, mas também o quanto essa perda é potencialmente danosa.
Assim, é possível que, num futuro próximo, mais uma ferramenta seja disponibilizada para o acompanhamento de gestantes, na busca de promover um melhor apoio ao nascimento e, consequentemente, diminuindo a taxa de desfechos negativos relacionados à antecipação do parto.
FONTES:
- Diniz CSG,Reis-Queiroz J, Kawai CA, Queiroz, MR, Bonilha EA, Niy D, Lansky S7, Sena BF. Dias potenciais de gravidez perdidos: uma medida inovadora da idade gestacional. Rev Saude Publica. 2020;54:88
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- Chawanpaiboon S, Vogel JP, Moller AB, Lumbiganon P, Petzold M, Hogan D, et al. Global, regional, and national estimates of levels of preterm birth in 2014: a systematic review and modelling analysis. Lancet Glob Health. 2019;7(1):e37-46
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- Organização Mundial de Saúde. Programa de Reprodução Humana. Declaração da OMS sobre Taxas de Cesáreas. Genebra: OMS; 2015