A coqueluche é uma doença infecciosa de origem bacteriana que teve seu impacto na sociedade muito reduzido com a introdução das vacinas tetravalente e tríplice bacteriana (DTP). Com a ampliação da cobertura vacinal, houve uma diminuição importante dos casos e uma modificação no perfil epidemiológico dos pacientes com a doença. Atualmente, os principais acometidos são crianças menores de 1 ano, seguidos por adolescentes e adultos.
Nesse post iremos abordar o que é a coqueluche, como se manifesta, o diagnóstico e o tratamento dessa infecção bacteriana.
O que é o coqueluche?
A coqueluche é uma infecção bacteriana causada pela bactéria Bordetella pertussis, sendo uma doença infantil prevenível por vacina. O nome deriva do termo francês "coqueluchon", que significa "pequena tosse", descrevendo o sintoma mais comum e característico dessa doença.
A transmissão ocorre principalmente por secreções respiratórias contaminadas em forma de aerossois, sendo altamente contagiosa e causando doença em torno de 80% dos contatos próximos. O período de transmissibilidade da doença ocorre principalmente entre o 5º dia após início dos sintomas até a 3ª semana da doença.
Epidemiologia
A doença é amplamente distribuída em todo o mundo, com surtos e casos endêmicos ocorrendo regularmente, especialmente em comunidades onde a imunização é baixa. Antes do advento da vacinação generalizada, o problema era uma das principais causas de morbidade e mortalidade infantil em muitos países.
Apesar dos esforços de vacinação, continua a ser uma preocupação de saúde pública em algumas regiões, especialmente devido ao surgimento de cepas resistentes a antibióticos, devido à diminuição da imunidade conferida pela vacina ao longo do tempo e pela queda das taxas vacinais nas últimas décadas.
Fisiopatologia
A Bordetella pertussis coloniza o trato respiratório superior, particularmente os cílios das células epiteliais das vias aéreas. Ela produz várias toxinas, principalmente a toxina pertussis, que desempenha um papel fundamental na patogênese da doença. Essas toxinas interferem na resposta imunológica do hospedeiro, levando à inflamação das vias aéreas e à produção excessiva de muco. Isso resulta nos sintomas característicos da coqueluche, incluindo tosse paroxística, estridor inspiratório e episódios de apneia.
Ademais, a tosse paroxística, caracterizada por crises súbitas e incontroláveis e produção de som que lembra um “guincho”, ocorre devido a produção da bradicinina, com consequente ativação de nervos sensoriais que provocam o estímulo da tosse.
Veja também:
Quais são os sintomas da coqueluche?
A coqueluche tem sua forma clínica em três fases, que correspondem à evolução da doença.
Fase catarral
A primeira fase é a catarral, com duração de 1 a 2 semanas, iniciando de forma insidiosa. O paciente pode apresentar congestão nasal, rinorreia, lacrimejamento, mal-estar, febre pouco intensa e instalação gradual dos surtos de tosse seca noturna, essas aumentam progressiva e gradualmente se tornando diurnas.
Fase paroxística
A fase paroxística procede a fase catarral, por volta de 10 a 14 dias após o início dos sintomas, e sua principal característica é a presença da tosse, com 5 a 10 tossidas a cada expiração. Durante a inspiração, à medida que o ar atravessa a glote, há formação do característico estridor rápido à inspiração (o som de “guincho”), como mencionado acima. Ademais, o paciente apresenta protrusão da língua e congestão, podendo evoluir para cianose e êmese pós-tosse. Essa fase dura cerca de 6 semanas.
Fase de convalescência
Na fase de convalescência, fase final da coqueluche, o paciente apresenta melhora progressiva da tosse, podendo piorar em caso de infecções respiratórias recorrentes. Tem duração entre 2 e 6 semanas, podendo a tosse persistir por 3 meses.
Indivíduos vacinados vão apresentar a forma mais leve da doença, com tosse persistente sem paroxismo, som de “guincho” a inspiração e êmese pós-tosse. O principal grupo de risco para a coqueluche são lactentes menores de 6 meses. Eles podem apresentar os sintomas clássicos em conjunto com sinais de gravidade, como apneia, parada respiratória, convulsões e desidratação devido aos vômitos frequentes.
Diagnóstico da coqueluche
O padrão-ouro para diagnóstico da coqueluche é o PCR através da cultura de nasofaringe, devido ao tropismo da bactéria pelo epitélio respiratório. O procedimento deve ser feito idealmente antes do paciente fazer uso da antibioticoterapia, ou até 3 dias após seu início. Além desse método, o leucograma também pode auxiliar no diagnóstico, principalmente em pacientes não vacinados.
Durante o período catarral ocorre linfocitose acima de 10.000/mm3 e, na fase paroxística, há leucocitose de 30 a 40 mil/mm3. Assim, a presença de linfocitose seguida de leucocitose eleva as suspeitas de coqueluche. Entretanto, em pacientes lactentes e não vacinados, esse pico de linfocitose é inexistente.
O raio-x pode ter utilidade para avaliar outras possíveis complicações, sendo recomendado para crianças menores de 4 anos. A presença de infiltrados pulmonares pode se apresentar como sinal característico, como demonstrado abaixo. O diagnóstico diferencial deve ser feito com outras doenças do trato respiratório, como traqueobronquites, bronquiolites e laringite.
Tratamento da coqueluche
O tratamento é feito preferencialmente com a azitromicina, 10 mg/kg/dia, com 1 dose por dia durante 5 dias. É a droga de escolha para crianças menores de um mês de idade, e para gestantes ou puérperas que apresentaram tosse por 5 dias e entraram em contato prévio com a bactéria. A claritromicina é uma droga de segunda escolha, devendo ser usada de 12 em 12 horas, por 7 a 10 dias, com a dose variando de acordo com a idade.
O tratamento hospitalar, com isolamento respiratório, é reservado para lactentes com infecção grave. O isolamento é mantido até o 5º dia de tratamento com antibióticos.
A principal forma de prevenção da coqueluche é por meio da vacinação na infância, com as 5 doses da vacina acelular contra a coqueluche (embutida nas vacinas tetravalente e tríplice bacteriana) com a imunidade natural durando aproximadamente 20 anos. Quanto à profilaxia pós-exposição, deve-se administrar antibióticos nos contatos domiciliares em até 21 dias do início da tosse no primeiro paciente, independentemente de terem sido vacinados ou não.
Conclusão
Com a implementação das vacinas tetravalente e tríplice bacteriana (DPT), a incidência e o impacto da coqueluche na sociedade diminuíram significativamente. No entanto, apesar da melhoria na cobertura vacinal, a coqueluche continua a ser uma preocupação de saúde pública, especialmente devido à emergência de cepas resistentes a antibióticos e à diminuição da imunidade conferida pela vacina ao longo do tempo.
Atualmente, a doença afeta principalmente crianças menores de 1 ano, adolescentes e adultos, destacando a importância contínua da conscientização, vacinação e tratamento adequado para controlar sua disseminação e proteger os grupos vulneráveis.
Leia mais:
- Indicadores de morbidade: como cai na prova de residência?
- Você domina o manejo da doença meningocócica?
- Febre amarela: transmissão, sintomas e tratamento
- Endemia, epidemia, pandemia e surto: entenda a diferença
- Calendário de imunização: revisão para a prova de residência médica
FONTES:
- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de Vigilância em Saúde. Brasília, 2019.