As colagenoses são doenças que acometem o tecido conjuntivo, podendo acometer também outros sintomas, de natureza autoimune. É comum causarem principalmente sintomas dermatológicos e reumatológicos, acometendo mais mulheres em idade fértil. Elas são um grupo de doenças variadas, que geram um quadro clínico bastante distinto.
Neste post, iremos abordar as principais colagenoses, seus sintomas, fisiopatologia e tratamento!
O que são as colagenoses?
As colagenoses, ou doenças do colágeno, são um grupo de doenças que se caracterizam por um processo inflamatório crônico do tecido conjuntivo, com comprometimento de pequenos vasos, vários órgãos, principalmente articulações, músculos e pele.
O tecido conjuntivo apresenta inúmeras funções, como sustentação, preenchimento, elasticidade e defesa do organismo. Ele pode ser tecido sanguíneo, tecido ósseo, tecido cartilaginoso, tecido adiposo e tecido conjuntivo propriamente dito.
Apesar de serem menos comuns que outras doenças reumatológicas, como artrose e gota, as colagenoses são de grande importância devido à maior morbimortalidade. Além disso, todas elas provocam grande dano social na vida dos pacientes.
Principais colagenoses
As principais colagenoses são: artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico (LES), esclerose sistêmica, síndrome de Sjogren, dermatomiosite e doença mista do tecido conjuntivo.
Artrite reumatoide
A artrite reumatoide é uma doença reumatológica autoimune que acomete principalmente as articulações, mas também causa manifestações extra-articulares. É uma doença inflamatória crônica, causada pela interação de fatores genéticos, principalmente os alelos HLA-DR1 01, 04 e 10, e ambientais.
Nesses pacientes susceptíveis, algum gatilho ambiental gera inflamação na membrana sinovial das articulações periféricas e ocorre uma neoformação vascular e invasão de células inflamatórias e autoimunes. A inflamação das articulações ao longo do tempo leva à destruição da articulação com perda de cartilagem e erosões ósseas.
Os sintomas mais comuns são dor e edema nas articulações, principalmente das mãos, punhos e tornozelos, com rigidez matinal. Sem tratamento evolui para lesões articulares e deformidades, como os achados clássicos de desvio ulnar, deformidade em pescoço de cisne e dedo em botoeira. Das manifestações extra-articulares, a mais comum são os nódulos reumatoides. O diagnóstico é feito por meio do quadro clínico associado a achados laboratoriais, como fator reumatoide ou anti-CCP positivos e níveis elevados de VHS e PCR.
O tratamento é feito com os medicamentos anti-reumáticos modificadores da doença (DMARDs): metotrexato (primeira escolha), hidroxicloroquina, sulfassalazina e leflunomida, associado a analgésicos para as dores.
Lúpus eritematoso sistêmico
O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de origem autoimune, com apresentação clínica extremamente variável. Ela é uma doença de etiologia desconhecida, sendo uma combinação de fatores genéticos, imunológicos, endócrinos e ambientais. Para mais, acomete os diversos sistemas do corpo, da pele ao sistema nervoso.
O fator ambiental em pessoas geneticamente susceptíveis parece ser o que leva a ativação da autoimunidade. O dano celular causado pelos fatores ambientais gera ativação de células T e B, gerando uma resposta imune crônica e autodirecionada, que leva a danos aos órgãos, por formação de imunocomplexos.
As características clínicas podem variar desde uma doença muito leve, com envolvimento apenas mucocutâneo, até uma doença grave com envolvimento de múltiplos sistemas. Do ponto de vista dermatológico, a alteração mais típica do LES é o rash malar ou rash em borboleta (lesão eritematosa que acomete bochechas e ponte nasal). É bastante típico também as lesões discóides, típicas do LES discóide.
Outros sintomas comuns no LES são: febre, leucopenia, trombocitopenia, delírio e psicose, convulsão, alopecia, derrame pleural ou pericárdico, pericardite e nefrite lúpica. O paciente costuma ter o FAN positivo, podendo ter também outros anticorpos como anticardiolipina e anticoagulante lúpico positivos, além de C3 e/ou C4 baixos.
O tratamento é feito de acordo com o grau de acometimento do paciente, variando de tratamento mínimo (AINEs, anti maláricos) até ao tratamento intensivo (corticosteróides e imunobiológicos).
Esclerose sistêmica (Esclerodermia)
A esclerose sistêmica é caracterizada por fibrose progressiva cutânea (esclerodermia) e de outros órgãos (sistêmica), como disfunção ventricular. Sua etiologia é uma junção de predisposição genética e fatores ambientais (como exposição a CMV, cloreto de vinil e bleomicina).
O quadro clínico é caracterizado por edema, espessamento e endurecimento da pele, esclerodactilia (perda dos sulcos, contratura cutânea e úlceras intercarpal falangianas), nariz afilado, telangiectasias, calcinose cutânea, fenômeno de Raynaud, hipertensão arterial pulmonar, poliartrite crônica simétrica não-erosiva, miosite e doença pulmonar intersticial. Pode acometer também o esôfago (disfagia distal), intestino (estase e crescimento bacteriano) e rins (crise renal esclerodérmica).
O diagnóstico da esclerose sistêmica é a junção de achados clínicos com alterações laboratoriais. Os critérios de 2013 da ACR/EULAR ajudam no diagnóstico, sendo considerado forte se pontuação maior ou igual a 9 pontos.
O tratamento da esclerose sistêmica vai depender do grau de acometimento. Se o acometimento for cutâneo pode-se fazer metotrexato, ciclofosfamida, micofenolato, rituximabe ou imunobiológicos. Para pacientes com o fenômeno de Raynaud, é recomendado o aquecimento das mãos e pode-se utilizar de bloqueadores de canal de cálcio como nifedipino. Para o acometimento articular, medicações como corticoides, hidroxicloroquina e metotrexato tem boa resposta.
Por fim, para o acometimento pulmonar, vai depender do tipo de acometimento. Para pacientes com quadro doença intersticial por alveolite, recomenda-se imunossupressores, ciclofosfamida e micofenolato. No caso de doença intersticial por fibrose, o uso de anti-fibróticos, como nintedanib e pirfenidona, é recomendado. Já para a hipertensão arterial pulmonar, usa-se sildenafila, bosentana ou iloprosta.
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Síndrome de Sjogren
A síndrome de Sjogren é uma doença autoimune caracterizada por acometimento de glândulas salivares e lacrimais associado a acometimento sistêmico. Clinicamente, o paciente se apresenta com quadro de xerostomia, xeroftalmia, xerodermia, dispareunia e parotidite recorrente. Associado a esses achados típicos, o paciente apresenta quadro de fadiga, poliartralgia e anemia hemolítica.
A doença pode acometer também pulmão (doença intersticial pulmonar), pele (eritema nodoso) e rins (glomerulonefrite). O paciente com síndrome de Sjogren está em maior risco de linfoma do tipo MALT. O diagnóstico é feito por meio de clínica com achados laboratoriais, como pode ser visto abaixo:
O item 3 aborda dois escores que avaliam o grau de secura ocular: o ocular straining score e o Bijsterveld score. Já o item 4 aborda o teste de Schimmer, um teste que mede a quantidade de lágrima produzida em 5 minutos. Valores ≤ 5 mm em 5 minutos são sugestivos de olho seco.
O tratamento é direcionado ao quadro clínico. Para os sintomas secos, recomenda-se evitar medicações anticolinérgicas, recomenda-se hidratação oral, mascar chiclete sem açúcar (estimula salivação), colírios lubrificantes, hidratantes corporais, lubrificantes vaginais e pode ser feito agentes colinérgicos (pilocarpina, cevimelina).
Para os sintomas de artrite, faz-se hidroxicloroquina, metotrexato, rituximabe, micofenolato ou azatioprina. Para demais acometimentos, pode-se fazer corticoterapia associada a ciclofosfamida.
Dermatomiosite
A dermatomiosite é uma miopatia autoimune sistêmica que pode aparecer na vida adulta ou ainda na infância (dermatomiosite juvenil). É caracterizada por quadro cutâneo, de rash facial em sulco nasolabial e os achado típicos de pápulas de Gottron (pápulas sobre articulações dos dedos) e sinal de Gottron (eritema em cotovelos, joelhos e superfícies extensoras). E ainda, heliotrópio (edema e eritema nas pálpebras) e sinal do xale (lesões eritematosas em dorso e cervical em forma de V).
Associada às alterações cutâneas, paciente apresenta-se com quadro de fraqueza muscular progressiva, simétrica e proximal, que pode evoluir com insuficiência respiratória. Além disso, cerca de 40% dos pacientes podem apresentar também doença pulmonar intersticial.
O tratamento de casos leves e moderados é feito com prednisona associado a azatioprina ou metotrexato. Nos casos graves, pode ser necessária pulsoterapia com metilprednisolona por 3 a 5 dias, seguido por tratamento oral com prednisona. Nos casos refratários, pode-se fazer rituximabe ou imunoglobulinas. Por fim, nos pacientes com doença pulmonar intersticial pode ser feito ciclofosfamida, micofenolato, azatioprina ou rituximabe.
Doença mista do tecido conjuntivo
A Doença Mista do Tecido Conjuntivo é uma doença autoimune sistêmica rara, com altos níveis de anticorpos anti-U1 ribonucleoproteína (RNP) associados a manifestações clínicas comuns a pelo menos duas colagenoses: lúpus eritematoso sistêmico, polimiosite, esclerose sistêmica, artrite reumatoide e dermatomiosite. O sintoma mais comum dessa afecção é o fenômeno de Raynaud. Comumente há também acometimento cutâneo, articular, muscular e pulmonar.
Os critérios diagnósticos são anti-RNP acima de 1:1600 mais pelo menos 3 dos seguintes: edema de mãos, sinovite, miosite, fenômeno de Raynaud e acroesclerose. O tratamento é semelhante às demais colagenoses. Pode ser feito corticoide, hidroxicloroquina e imunossupressores como azatioprina, metotrexato e micofenolato.
Conclusão
As colagenoses são um grupo de doenças que acomete o tecido conjuntivo de natureza autoimune, em geral mais comum em mulheres. São elas as principais: lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide, síndrome de Sjogren, dermatomiosite, esclerose sistêmica e a doença mista do tecido conjuntivo.
No geral, elas causam sintomas cutâneos, articulares e pulmonares, podendo também acometer outros órgãos. O tratamento varia de acordo com doença, com uso de corticoide, imunossupressores e imunobiológicos, além de sintomáticos.
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FONTE
- NASCIMENTO, Fernando. Colagenoses.
- VAILLANT, Angel; et.al. Systemic Lupus Erythematosus - StatPearls - NCBI Bookshelf
- MOREIRA, Caio. Reumatologia Essencial. 2020
- CHAUHAN, K; et. al. Rheumatoid Arthritis - StatPearls - NCBI Bookshelf