A amenorreia é um tema da Ginecologia extremamente amplo e a chave do seu entendimento é a diferenciação diagnóstica. Através desse estudo, busca-se investigar as diversas causas, desde a gestação até anomalias congênitas, permitindo um cuidado personalizado e uma abordagem terapêutica adequada para cada paciente. Vamos entender as definições necessárias, além do plano investigativo e suas etapas.
O que é amenorreia?
O termo amenorreia significa a ausência ou interrupção do período de sangramento no ciclo menstrual de uma mulher em idade fértil, podendo ser temporária ou permanente. Ela deve ser classificada entre primária e secundária, sendo, respectivamente, a falta do sangramento em mulheres que nunca o tiveram, e a ausência do sangramento em mulheres que já menstruaram antes. Abaixo estão alguns critérios adicionais para a investigação:
Quais são as principais causas de amenorreia?
Causas de amenorreia primária
Anormalidades congênitas
Mulheres que nascem com malformações ou anomalias nos órgãos sexuais com potencial de interferir na menstruação. São exemplos dessas condições a Agenesia completa ou parcial uterina, Hipoplasia ovariana e a Insuficiência ovariana primária.
Síndrome de Turner
A síndrome de Turner é uma condição genética que afeta o sexo feminino pela ausência total ou parcial de um dos cromossomos X. Além da amenorreia, outras características dessa síndrome são a baixa estatura, pescoço alado, coarctação da aorta, alargamento de caixa torácica e nevos pigmentados.
Distúrbios hormonais
Diversas podem ser as causas de amenorreia por problemas na função hormonal, são exemplos: Hiperplasia adrenal congênita (HAC), Hipogonadismo Hipogonadotrófico, deficiência de GH, entre outras condições endócrinas.
Causas de amenorreia secundária
Gravidez e Amamentação
A gravidez e a amamentação são as causas mais comuns em mulheres de idade fértil, sendo sempre a primeira hipótese diagnóstica nesses tipos de pacientes. A menstruação, juntamente com a ovulação, cessa logo na fecundação e retorna a partir da 4 a 8 semana, podendo demorar mais caso esteja em período de amamentação.
DICA DE PROVA
Epidemiologicamente, a segunda causa mais frequente de amenorreia, vindo depois da gestação, é a Síndrome do ovário policístico (SOP). Esse é um distúrbio endócrino que cursa com crescimento de múltiplos cistos nos ovários, além de desordens hormonais secundárias a isso.
Estresse e perda de peso excessiva
Estresse crônico e a rápida perda de peso podem afetar a regulação hormonal, causando tanto irregularidade menstrual como interrupção da mesma. Nesse quesito, vale ressaltar os distúrbios alimentares como uma importante causa de amenorreia por perda de peso, principalmente a Anorexia, Bulimia e Ortorexia. Juntamente a isso, pode haver Vigorexia como outro fator de risco.
Condições médicas subjacentes
Diversas condições que afetam outros sistemas podem causar, secundariamente, a interrupção dos sangramentos menstruais, como problemas da tireoide, tumores e outras disfunções neuroendócrinos, hiperprolactinemia, Síndrome de Asherman e Síndrome de Sheehan.
Quais são os fatores de risco para a amenorreia?
Diante dos incontáveis quadros causadores do problema, entende-se que cada condição possui sua fisiopatologia e fatores de risco próprios. Dividindo de uma maneira abrangente, os fatores de risco podem ser do tipo comportamental ou associados a patologias orgânicas. Os comportamentais podem ser a prática exacerbada de exercícios físicos, transtornos alimentares, o uso de substância e até a gravidez e amamentação. Já os orgânicos advêm de distúrbios de diversos sistemas, com destaque para endócrino e urogenital, além dos transtornos genéticos.
Leia também:
- O que é Residência em Ginecologia e Obstetrícia, áreas de atuação, rotina, habilidades e remuneração
- O impacto da inteligência artificial na medicina e na formação médica
- Médicos no Brasil: pesquisa revela quanto ganham e a situação trabalhista
Principais sintomas da amenorreia
A condição de amenorreia em si é assintomática, sendo identificada pela ausência do sangramento durante o ciclo menstrual. Porém, os possíveis sintomas que podem ocorrer serão advindos da condição causadora. As condições que causam quadro clínico mais perceptível são a gravidez e as alterações hormonais, caso o problema esteja acontecendo por patologia endócrina.
Diagnóstico da amenorreia
O diagnóstico é feito pela investigação clínica e laboratorial, que pode ser dividida em 4 etapas. A primeira etapa é feita pela dosagem de beta-HCG, Prolactina e TSH. A segunda etapa é feita pelo teste da Progesterona. Na terceira é realizado o teste do Estrogênio + Progesterona, e na penúltima é realizada a dosagem de LH e FSH. Já na quinta e última etapa é feito o teste do GnRH. Vamos destrinchar a seguir cada uma delas e os diagnósticos que podem ser feitos:
Etapa 1 - Dosagem de β-HCG, Prolactina e TSH
Essa etapa solicita dosagem laboratorial do hormônio B-HCG produzido pela placenta, prolactina e TSH, produzidos pela hipófise. O B-HCG diagnostica a gravidez, a causa mais comum. A Prolactina irá descartar a Hiperprolactinemia, que bloqueia a liberação de gonadotrofina que leva à amenorreia, podendo ter como causa: antidepressivos (principalmente tricíclicos), hipotireoidismo ou prolactinoma hipofisário. O TSH afasta hipo e hipertireoidismo.
Etapa 2 - Teste da Progesterona
Nessa fase, é dado à paciente Progesterona por um período de 7 a 10 dias. Se houver sangramento após a retirada do medicamento significa que a causa é a anovulação, logo, a paciente já tinha o endométrio pronto, porém sem descamar pela ausência do gatilho da ovulação que faz com que passe da primeira fase do ciclo menstrual para a segunda fase. Vale salientar que as causas de anovulação podem ser: SOP, Síndrome de Cushing, Disfunção tireoidiana e tumores produtores de estrogênio e androgênio.
Caso a paciente não menstrue após o uso de progesterona com interrupção entre 7 e 10 dias, é indicativo da existência de fator anatômico ou hipogonadismo. Além disso, o ciclo hormonal e menstrual da paciente podem ser normais, mas há um fator anatômico que impossibilita o sangramento. Ou ainda, existe algum distúrbio hormonal que ocorre antes da progesterona no ciclo menstrual, como a falta de estrogênio que prepara o endométrio.
Etapa 3 - Teste do Estrogênio com Progesterona
Esse teste serve para diferenciar as duas condições citadas anteriormente, o hipogonadismo ou distúrbio anatômico. A administração de Estrogênio seguida de Progesterona é a simulação do que ocorre em um ciclo a nível hormonal. Caso haja sangramento, confirma-se um hipogonadismo que pode ser de causa hipotalâmica, hipofisária ou ovariana. Caso não haja sangramento, é atestado um problema anatômico a ser esclarecido por exame pélvico associado à ultrassonografia.
DICA DE PROVA
Não perca uma questão por não saber termos semiológicos! Nas amenorreias de causa anatômica, a retenção e não-exteriorização da descamação endometrial é chamada de "Criptomenorreia", e o acúmulo desse sangue pode ser chamado de "Hematométrio", caso o sangue esteja na cavidade uterina, já se estiver no canal vaginal é denominado "Hematocolpo".
Etapa 4 - FSH e LH
Essa é a investigação para saber de onde vem o hipogonadismo, caso ele tenha sido identificado. Se o FSH e LH estiverem elevados, é um hipogonadismo hipergonadotrófico de causa ovariana. Se estiverem diminuídos, é um hipogonadismo hipogonadotrófico, que tem origem nervosa central, podendo originar-se tanto no hipotálamo quanto na hipófise.
Etapa 5 - Teste do GnRH
Nesta fase, é administrado hormônio GnRH para diferenciar se o hipogonadisto hipogonadotrófico é de causa hipotalâmica ou hipofisária. Se após o uso do GnRH houver o aumento dos níveis de FSH e LH, a condição que estava ocorrendo era advinda de hipofunção do hipotálamo. Se os níveis de FSH e LH não aumentarem, o problema está ocorrendo a nível hipofisário.
DICA DE PROVA
Apesar dos diversos exames laboratoriais, jamais negligencie o exame físico! Além de ser sempre soberano na prática clínica, características do exame físico podem ser descritas na sua questão de prova. Por exemplo, o examinador pode descrever uma hipotrofia genital em um quadro de hipogonadismo hipogonadotrófico. Ao ler a questão, distingua ativamente Anamnese + Exame Físico + Laboratoriais e faça a correlação clínica.
Quais são os principais tratamentos para a Amenorreia?
O tratamento é completamente dependente da causa identificada nas 5 etapas da investigação diagnóstica. As alterações anatômicas são, na maioria das vezes, corrigidas de maneira cirúrgica. Os quadros ligados a anomalias cromossômicas demandam terapia de reposição hormonal visando prevenir as consequências ligadas ao hipoestrogenismo, como a osteopenia e doenças cardiovasculares.
Ademais, as condições hiperestrogênicas deverão receber contraposição progestagênica para prevenir hiperplasia endometrial e o adenocarcinoma de endométrio. Por fim, uma medida importante é fornecer um acompanhamento multidisciplinar, visto que muitas questões emocionais podem estar envolvidas nos casos do problema, principalmente nas condições que colocam em risco a fertilidade da mulher.
Conclusão
A diferenciação diagnóstica desempenha um papel fundamental na identificação das causas subjacentes da amenorreia. É necessário compreender as definições e seguir um plano investigativo bem estruturado, que envolve etapas específicas para obter um diagnóstico preciso. Ao realizar uma avaliação abrangente e precisa, é possível garantir o melhor tratamento, proporcionando uma melhor qualidade de vida para as mulheres afetadas por essa condição.
Leia mais:
- Miomatose Uterina: definição, quadro clínico e tratamento
- Você domina a conduta da Endometriose?
- Câncer de colo do útero: o que é, como prevenir, diagnosticar e tratamentos
- Sofrimento Fetal: O que é, Causas e Como Diagnosticar?
- Hemorragia pós-parto: da fisiopatologia ao tratamento
FONTES:
- Viana, Luiz, C. e Selmo Geber. Ginecologia. Disponível em: Minha Biblioteca, (3rd edição). MedBook Editora, 2012.
- Amenorrhea - Medscape