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Publicado em
11/1/24

Isquemia mesentérica: o que é, sintomas, diagnóstico e tratamento

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Isquemia mesentérica: o que é, sintomas, diagnóstico e tratamento

A isquemia mesentérica aguda é uma emergência grave caracterizada pelo bloqueio súbito do fluxo sanguíneo para o intestino, podendo levar à necrose e complicações severas. Suas várias formas e causas demandam um diagnóstico rápido e manejo imediato, justamente pela sua rápida progressão. Esse tema engloba bastante anatomia de vascularização abdominal. Vamos revisar?

O que é a isquemia mesentérica?

A isquemia mesentérica aguda é uma emergência vascular devido à isquemia intestinal súbita resultante do bloqueio do fluxo sanguíneo, sendo ele venoso ou arterial. Existem diferentes tipos de problema, cada um com seus mecanismos diferentes. A isquemia oclusiva arterial ocorre na artéria mesentérica superior através de êmbolos e trombos em pacientes com alterações pré-existentes na parede arterial. 

Por outro lado, a isquemia arterial não oclusiva resulta da redução do débito cardíaco, acompanhada por espasmos reativos nos vasos mesentéricos. Por fim, a isquemia venosa se desenvolve devido à trombose no eixo mesentérico-portal, constituindo outro subtipo dessa condição.

Isquemia mesentérica aguda causada por bloqueio de vaso. Fonte: Mesenteric Ischemia: Causes, Symptoms & Treatment
Isquemia mesentérica aguda causada por bloqueio de vaso. Fonte: Mesenteric Ischemia: Causes, Symptoms & Treatment

Etiologia  

As causas de isquemia mesentérica podem ser divididas em: oclusiva e não oclusiva. A isquemia oclusiva é desencadeada por eventos como a oclusão tromboembólica aguda da artéria mesentérica superior. Nestes casos, o embolismo arterial corresponde a 50% dos diagnósticos, enquanto a trombose arterial por aterosclerose compreende de 25% a 30% dos casos. 

Já a trombose venosa mesentérica, responsável por cerca de  15% das ocorrências, está ligada à clássica Tríade de Virchow para trombose venosa - estase, lesão epitelial e hipercoagulabilidade. A TVM pode surgir de trombose primária ou idiopática, mas a maioria dos casos estão associados a trombofilia, trauma, ou alterações inflamatórias locais, como pancreatite, diverticulite ou inflamação ou infecção do sistema biliar. 

Tríade de Virchow. Fonte: Raciocínio Clínico
Tríade de Virchow. Fonte: Raciocínio Clínico

Por outro lado, a isquemia mesentérica não oclusiva, que inclui a colite isquêmica, é caracterizada por uma baixa perfusão mesentérica com espasmos vasculares reativos, decorrentes de baixo fluxo sanguíneo. As condições clínicas mais comuns que levam a isso incluem hemodiálise prolongada, hipovolemia, cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea (em operações cardíacas), vasculites, lesões traumáticas, dissecção ou inflamação aórtica, aterosclerose, entre outras.

Fisiopatologia 

O embolismo pode envolver a artéria mesentérica superior na maioria dos casos de isquemia entérica devido ao ângulo oblíquo de origem a partir do segmento aórtico visceral. Os trombos embólicos geralmente se alojam na porção proximal da artéria mesentérica superior, distal à artéria cólica média. Os ateroembolismos normalmente se alojam na circulação mesentérica distal.

Esquema da irrigação arterial dos intestinos. Fonte: Blog Dr. Derival Afonso
Esquema da irrigação arterial dos intestinos. Fonte: Blog Dr. Derival Afonso

Já a trombose venosa geralmente só gera consequências importantes quando está localizada centralmente e afeta mais de uma área de drenagem. Independentemente da causa, dentro de 6 horas da interrupção do fluxo sanguíneo, ocorre isquemia irreversível e desintegração das barreiras mucosas intestinais, alterações morfológicas na parede intestinal e necrose do intestino.

Esquema da drenagem venosa dos intestinos. Fonte: Blog Dr. Derival Afonso 
Esquema da drenagem venosa dos intestinos. Fonte: Blog Dr. Derival Afonso 

Que tal revisar a anatomia vascular intra-abdominal? Na aula abaixo, Dr Amyr Kelner vai resumir os pontos chave desse tópico base da Cirurgia Geral:

Sintomas da isquemia mesentérica  

O quadro característico da isquemia mesentérica é a dor abdominal intensa fora de proporção. Outros sintomas típicos podem incluir evacuações intensas, êmese, diarreia e distensão abdominal. Se a isquemia for causada por um êmbolo, o início e o declínio clínico podem ser mais abruptos devido à falta de vasos colaterais. 

O relato do paciente costuma ser de cólicas abdominais súbitas que duram de 3 a 6 horas, geralmente seguidas por um intervalo sem dor e então sintomas de peritonite, que podem incluir dor abdominal, febre, rebaixamento do nível de consciência (especialmente em pacientes idosos), calafrios, náuseas ou vômitos. 

Em casos de doença não oclusiva, a dor abdominal aumenta em pacientes responsivos e pode ocorrer após cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea, sendo que os sintomas podem começar quando os pacientes estão em estado instável e frequentemente recebendo sedação, ventilação artificial ou analgesia. 

Para trombose, a apresentação subaguda pode começar algumas semanas antes da instalação dos sintomas agudos por haver tempo de desenvolvimento de uma circulação colateral. Em casos de trombose venosa, os sinais e sintomas dependem da gravidade, geralmente são sintomas abdominais inespecíficos que duram vários dias e, em casos raros, podem incluir infarto venoso com peritonite.

DICA DE PROVA 

Apesar do quadro clínico da Isquemia Mesentérica Aguda variar muito nas suas questões de residência, aqui vai um clássico quando querem buscar de você o pensamento clínico e diagnóstico de IMA: paciente com fibrilação atrial, dor abdominal excruciante sem peritonite (gerando uma desproporção entre exame físico e sintoma referido) e uma acidose lática vista pela gasometria arterial.

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Como diagnosticar a isquemia mesentérica? 

É necessário suspeitar de isquemia mesentérica aguda em pacientes com dor abdominal intensa persistente por mais de 3 horas sem outra explicação no quadro clínico. Por exemplo, pacientes com história de doença cardiovascular e apresentação de dor abdominal aguda fora de proporção com os achados físicos. Essa suspeita também vale após intervenção arterial com cateter atravessando a aorta visceral ou artérias proximais, IAM recente ou arritmia. 

Em casos de suspeita de isquemia intestinal aguda não oclusiva, considere pacientes que desenvolvem dor abdominal depois de um choque, especialmente cardiogênico; uso de vasoconstritores como cocaína, vasopressina ou norepinefrina; estados prolongados de hipotensão como hemodiálise, transplante renal ou qualquer cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea. 

Angiotomografia computadorizada evidenciando isquemia da porção média da Artéria Mesentérica Superior. Fonte: Lecturio‍
Angiotomografia computadorizada evidenciando isquemia da porção média da Artéria Mesentérica Superior. Fonte: Lecturio

O diagnóstico é confirmado por angiotomografia computadorizada, que mostra padrões de estenose ou oclusão arterial, alterações na espessura da parede intestinal, pneumatose e realce da mucosa ou parede intestinal. Apesar de não ser o mais comum, o exame de imagem com melhor resultado e elucidação do caso é a Angiografia.

Angiografia mesentérica superior evidenciando dilatação sacular em segmento proximal (seta) e compressão da luz arterial próximo à origem dos ramos jejunais (ponta da seta). Fonte: RearchGate
Angiografia mesentérica superior evidenciando dilatação sacular em segmento proximal (seta) e compressão da luz arterial próximo à origem dos ramos jejunais (ponta da seta). Fonte: RearchGate

Tratamento para a isquemia mesentérica 

O objetivo no manejo da Isquemia Mesentérica Aguda é restaurar o fluxo sanguíneo da maneira mais rápida possível. A laparoscopia exploratória de emergência ou laparotomia são indicadas se houver suspeita de sinais peritoneais de abdômen agudo, estenose e/ou sangramento gastrointestinal. O tratamento inicial em todos os casos inclui forte reposição de líquidos para estabilizar hemodinamicamente, sendo o tratamento do choque o passo inicial mais importante.

O monitoramento deve incluir débito urinário por hora e pressão arterial central sendo aferida continuamente. Deve-se evitar a ingesta oral para não agravar a isquemia intestinal. Antibióticos de amplo espectro (cefalosporina de segunda geração, levofloxacino ou metronidazol) são uma medida para cobertura de bactérias gram-positivas, gram-negativas e anaeróbias.

A anticoagulação com heparina pode ser iniciada e a continuação com varfarina é indicada se houver trombose da veia mesentérica. Para doença oclusiva arterial, é recomendada a revascularização antes da ressecção intestinal. Essa revascularização cirúrgica pode ser feita por meio de embolectomia, tromboendarterectomia ou cirurgia de bypass.

Outro método é o tratamento endovascular, que gera a revascularização por meio de trombolíticos transcatéter, angioplastia com balão ou stent, mas a laparotomia ainda pode ser necessária se for identificado uma porção intestinal não viável. Para trombose venosa mesentérica, a anticoagulação é a primeira linha, sendo preciso uma intervenção adicional, como: trombectomia ou trombólise direcionada por cateter. 

A ressecção intestinal deve ser adiada até após a revascularização para salvar o máximo de intestino delgado possível. O intestino claramente necrótico deve ser retirado, mas o objetivo é manter o comprimento mínimo do intestino para prevenir a síndrome do intestino curto. Um segundo procedimento de revisão de 1 a 2 dias depois da cirurgia pode ser necessário para avaliar a viabilidade do resto das porções intestinais.

Conclusão

A isquemia mesentérica aguda, uma emergência vascular grave devido ao bloqueio repentino do fluxo sanguíneo para o intestino, se divide em diferentes tipos baseado no mecanismo e localização. A rápida identificação e tratamento são importantes para evitar complicações graves, visto que o prolongamento do quadro pode causar necrose intestinal, ruptura dessas estruturas, peritonite, sepse e até a morte.

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