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Publicado em
4/10/24

Alcalose metabólica: o que é, causas e tratamento

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Alcalose metabólica: o que é, causas e tratamento

A alcalose metabólica é um distúrbio ácido-base caracterizado pelo aumento do pH sanguíneo devido a um excesso de bicarbonato ou perda de ácido. Esse desequilíbrio pode resultar de diversas condições, como vômitos frequentes ou uso de diuréticos. É necessário diagnosticar a condição precocemente para evitar suas complicações. Vamos revisar seus princípios e aspectos clínicos!

O que é Alcalose Metabólica?

A alcalose metabólica é caracterizada pelo aumento do pH sérico para > 7,45 - indicando uma alcalemia; Isso ocorre pelo aumento na concentração de bicarbonato (HCO3-) no plasma, o que pode ser causado tanto pela perda de H+ quanto pelo ganho de bicarbonato. Como mecanismo compensatório, o corpo responde com hipoventilação alveolar e aumento da PaCO2. Esse mecanismo reduz a magnitude da alteração que ocorreria na ausência da resposta compensatória.

Normalmente, a PaCO2 aumenta entre 0,5 e 0,7 mmHg para cada aumento de 1 mEq/L na concentração de HCO3-, refletindo uma resposta compensatória rápida. Quando essa relação não é mantida, pode ocorrer um distúrbio ácido-base misto. Por exemplo, se o aumento da PaCO2 excede 0,7 vezes o aumento no bicarbonato, pode haver uma coexistência de alcalose metabólica com acidose respiratória primária.

Causas da Alcalose Metabólica

Alcalose Responsiva ao Cloreto

A perda de ácido gástrico, secundária a vômitos, por exemplo, é uma causa comum de alcalose metabólica responsiva ao cloreto. Quando o ácido clorídrico (HCl) é eliminado do corpo, a secreção de bicarbonato pelo pâncreas não é mais estimulada adequadamente, o que leva a um acúmulo de bicarbonato sérico. A depleção de volume circulante associada a essa condição também contribui para a persistência da alcalose.

Outro fator importante é o uso de antiácidos não absorvíveis, como o hidróxido de magnésio. O consumo excessivo pode causar o problema por reagir com os íons hidrogênio gástricos e o bicarbonato liberado pelo pâncreas não ser totalmente eliminado nas fezes, resultando em uma absorção excessiva de bicarbonato. 

Além disso, os diuréticos tiazídicos e de alça podem induzir alcalose ao promoverem a excreção de cloreto e sódio pelos rins, o que aumenta a secreção de íons hidrogênio e potássio. A redução do cloreto disponível no corpo estimula a produção de aldosterona, levando a uma maior secreção de hidrogênio e potássio, resultando no agravamento da alcalose.

Alcalose Resistente ao Cloreto

O hiperaldosteronismo primário pode ser causado por condições como adenoma adrenal, hiperplasia adrenal bilateral e carcinoma adrenal, gerando alcalose metabólica resistente ao cloreto. O excesso de aldosterona causa a reabsorção de sódio com secreção de potássio e hidrogênio a nível renal, resultando em alcalose e hipertensão. 

Para mais, a deficiência da 11-beta-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2 também contribui para a alcalose metabólica. A falta dessa enzima faz com que o cortisol ocupe os receptores mineralocorticoides, imitando os efeitos da aldosterona ao promover a reabsorção de sódio e a excreção de potássio e hidrogênio.

A síndrome de Bartter e a síndrome de Gitelman são síndromes genéticas que afetam a reabsorção de sódio e cloreto nos rins. A síndrome de Bartter é caracterizada por uma deficiência na reabsorção na alça de Henle, enquanto a síndrome de Gitelman resulta da deficiência do transportador de sódio-cloreto no túbulo contorcido distal, ambas resultando em alcalose metabólica com hipocalemia.

Outras Causas

CAUSAS DIVERSAS DE ALCALOSE METABÓLICA

Sobrecarrega 

de solução alcalina

A administração de grandes quantidades de bicarbonato ou de precursores como citrato pode causar alcalose metabólica, especialmente se o corpo não consegue excretar o excesso de bicarbonato devido a insuficiência renal.

Síndrome 

do Leite-álcali

Este distúrbio ocorre com a ingestão excessiva de cálcio e antiácidos, levando a hipocalcemia, insuficiência renal e alcalose metabólica. A hipocalcemia pode promover a reabsorção de bicarbonato nos rins, agravando a alcalose.

Hipomagnesemia e Hipocalemia

A depleção de magnésio e potássio pode levar a uma leve alcalose metabólica. A hipocalemia é importante porque promove uma reabsorção aumentada de bicarbonato nos rins, assim como a hipomagnesemia.

Diversas etiologias da Alcalose metabólica. Fonte: EMR/Fernanda Vasconcelos.

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Quais os sintomas?

Imagem ilustrativa mostrando o sinal de Trousseau
Sinal de Trousseau: indução de espasmo carpal pela inflação de um esfigmomanômetro acima da pressão arterial sistólica durante três minutos. Fonte:  La Escuelita Médica

Um dos principais sinais clínicos é a hipocalemia, que pode levar a sintomas como fraqueza muscular, cãibras, poliúria e arritmias cardíacas. A hipocalcemia também pode ocorrer simultaneamente e gerar tremores, parestesias e espasmos musculares. Em casos graves, pode haver sinais como o sinal de Chvostek e o sinal de Trousseau.

Imagem ilustrativa mostrando o Sinal de Chvostek
Sinal de Chvostek: percussão de N. Facial (NC 7) gerando contração dos músculos faciais ipsilaterais. Fonte: La Escuelita Médica

A hipoventilação é outra consequência comum e ocorre pela inibição do centro respiratório na medula oblonga, o que pode levar a sintomas hipoxêmicos e dificuldade para desmame da ventilação mecânica em pacientes com reserva respiratória reduzida. Ademais, a pressão arterial pode reduzir e estar associada a sinais de hipovolemia. Em contrapartida, alcaloses resistentes ao cloreto podem ser acompanhadas de hipertensão e euvolemia.

Como realizar o diagnóstico?

A alcalose metabólica é identificada por meio de uma combinação de exames laboratoriais e avaliações clínicas. O diagnóstico inicial geralmente é feito através da medição dos eletrólitos séricos e pela gasometria arterial. Se a causa não for esclarecida na história clínica e exame físico, é possível realizar a medição da concentração de cloreto na urina para ajudar a identificar a causa.

Na medição da concentração de cloreto urinário, concentrações abaixo de 25 mmol/L sugerem alcalose metabólica responsiva ao cloreto, enquanto valores acima de 40 mmol/L indicam alcalose metabólica resistente ao cloreto. Concentrações entre 25 e 40 mmol/L podem indicar hipocalemia grave, hipovolemia por uso de diuréticos, entre outros. Nessas situações, a concentração de cloreto urinário sozinha não é uma boa ferramenta diagnóstica.

Cálculo do Excesso ou Déficit de Base

O excesso ou déficit de base é calculado para avaliar a gravidade da alteração no estado ácido-base. A fórmula usada é:

  • Excesso de Base = 0.929 (HCO3 − 24.4 + 14.8 (pH − 7.4))

VALOR DE REFERÊNCIA = -2 a 2 mEq/L

Um déficit de base menor que -2 mEq/L é considerado um déficit de base metabólica, enquanto um excesso de base maior que 2 mEq/L é um excesso de base metabólica. É importante notar que este cálculo não diferencia entre anormalidades ácidas-base mistas, mas indica a necessidade de mais ou menos base.

Avaliação da Compensação

Na avaliação da compensação na alcalose metabólica, o objetivo é verificar como o corpo ajusta o equilíbrio ácido-base para corrigir o aumento do pH sanguíneo. Isso é feito observando a resposta respiratória, onde o organismo tenta reduzir a pressão parcial de dióxido de carbono (pCO₂) por meio da hiperventilação. 

O pCO₂ compensatório esperado é comparado com os valores medidos para determinar se a compensação é adequada. Uma compensação adequada é dada pela fórmula: pCO2 = pCO2(base) - [0,6 x (HCO3 - 24)].

Tratamento da Alcalose Metabólica

O tratamento da alcalose metabólica depende da causa subjacente e do estado volêmico do paciente. Em casos de vômitos, é importante administrar antieméticos e, se a sucção gástrica contínua for necessária, deve controlar a secreção ácida gástrica com bloqueadores H2 ou inibidores da bomba de prótons. Para diuréticos tiazídicos ou de alça, pode-se reduzir a dose ou interromper. Ademais, pode-se adicionar um diurético poupador de potássio ou acetazolamida.

Já na alcalose responsiva ao cloreto, a administração intravenosa de solução salina isotônica é indicada, com correção da hipocalemia usando cloreto de potássio ou de sódio. Em pacientes muito edemaciados, como na insuficiência cardíaca congestiva, usa-se cloreto de potássio para evitar sobrecarga de volume caso fosse utilizado cloreto de sódio.

A alcalose metabólica resistente ao cloreto é tratada com base na causa específica, como hiperaldosteronismo primário, síndrome de Cushing, síndrome do excesso aparente de mineralocorticoides, ingestão de alcaçuz, e síndromes de Bartter e Gitelman.

Conclusão

A alcalose metabólica é um distúrbio ácido-base de etiologia diversa, que tem como tratamento a correção de desequilíbrios eletrolíticos, ajustes na medicação e, em alguns casos, a administração de soluções ácidas. A monitorização contínua e a avaliação da resposta ao tratamento devem permanecer contínuas durante todo o manejo para evitar complicações.

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